Não
existem sociedades sem mudanças. Há transformações maiores, que atingem toda a
humanidade, e menores, que acontecem no cotidiano das pessoas. Normalmente elas
estão interligadas. Duas grandes transformações – a Revolução Agrícola e a
Revolução Industrial – não foram percebidas de imediato pelas pessoas, pois
aconteceram lentamente.
Capítulo
21 – Mudança social e Sociologia
Hoje,
muitas mudanças são provocadas pelo desenvolvimento acelerado das tecnologias,
mas não conseguimos enxergar todos os seus efeitos em nossa vida. Existem
transformações mais evidentes, como as relacionadas às revoluções políticas e
sociais dos séculos XVIII e XIX, na Europa.
21.1. A mudança social para os
clássicos da Sociologia
A
Sociologia nasceu da crise provocada pela desagregação do sistema feudal e pelo
surgimento do capitalismo. As transformações e crises nas diversas sociedades constituem
um dos principais objetos da Sociologia. No século XVIII, com o Iluminismo, e
no XIX, a ideia de progresso ocupou lugar destacado e permeou o pensamento de
muitos autores.
Auguste Comte (1798-1857)
Sua
obra está permeada pelos acontecimentos da França pós-revolucionária.
Defendendo o espírito da Revolução Francesa de 1789, esse autor se preocupou com
a organização da nova sociedade. Comte acreditava que a mudança social estava na
mente, na qualidade e na quantidade de conhecimentos sobre as sociedades. Com
base nisso, afirmou que a humanidade percorreu três estágios na evolução do
conhecimento:
·
1º estágio – teológico - o mundo seria
regido por entidades e forças sobrenaturais, fossem elas espíritos, deuses ou
um deus único.
·
2º estágio – metafísico - o
sobrenatural deu lugar a ideias e causas abstratas e, portanto, racionais.
Seria o momento da Filosofia.
·
3º estágio – positivo - corresponde à
era da ciência e da indústria, na qual se invocam leis com base na observação
empírica, na comparação e na experiência. Seria o momento da Sociologia.
Em
termos sociológicos, Auguste Comte dividiu seu sistema em dois campos, o
estático e o dinâmico, expressos nas palavras ordem e progresso. A opção de
Comte era conservadora - a mudança (progresso) era admissível desde que não
alterasse profundamente a situação vigente (ordem).
Karl Marx
Também
analisou a Revolução Francesa, que considerava parcial, pois, realizada por uma
minoria, não emancipou a sociedade toda. Para ele, só uma classe capaz de
representar os interesses de libertação de todos pode liderar uma
transformação, que é resultado dos conflitos entre as classes fundamentais da
sociedade. No capitalismo essas classes são a burguesia e o proletariado. Este
tem o papel transformador.
Para
Marx, os participantes de uma revolução utilizam a cultura e as tecnologias
transmitidas pelas gerações anteriores para criar novas formas de organização
produtiva e política.
A
parte do passado que é incorporada e a maneira como isso acontece muitas vezes
condicionam o resultado das mudanças futuras. Isso depende das forças sociais
em conflito. De acordo com Marx, as revoluções só seriam possíveis por meio da
violência, pois os que detinham o poder jamais abririam mão dele pacificamente.
De
acordo com o sociólogo francês Robert Castel, no livro “As metamorfoses da
questão social”, a teoria marxista atribuía ao proletariado o poder
revolucionário porque “a constituição de uma força de contestação e de transformação
social supõe a reunião de pelo menos três condições: uma organização
estruturada em torno de uma condição comum, a posse de um projeto alternativo
de sociedade, o sentimento de ser indispensável para o funcionamento da máquina
social”. O movimento operário realizava a síntese dessas três condições.
Émile Durkheim
Em
sua análise sobre as mudanças sociais, Durkheim observou que na história das
sociedades houve uma evolução da solidariedade mecânica para a orgânica por
causa da crescente divisão do trabalho. Isso se deveu a fatores demográficos: o
aumento da população ocasionou intensidade de interações, complexidade de
relações sociais e aumento da qualidade desses vínculos.
Max Weber
Weber
analisou a mudança social relacionada ao nascimento da sociedade capitalista.
Além das condições econômicas, procurou centrar sua análise no plano das
ideias, das crenças e dos valores que permitiram a mudança. O sociólogo
desenvolveu a ideia de que a ética protestante foi fundamental para a
existência do capitalismo.
Compatível
com o “espírito do capitalismo”, a ética protestante valoriza o trabalho e as
atividades da vida secular. Segundo Weber, a ética protestante estimulou maior
acumulação de capital ao valorizar o trabalho e um modo de vida disciplinado,
responsável e racional, sem gastos ostentatórios.
Os
trabalhadores passaram a ver o trabalho como um valor em si mesmo. Assim, além
das condições econômicas, determinadas ideias e valores explicariam por que o
capitalismo só se desenvolveu no Ocidente. Weber também declarou que a
burocratização da sociedade é crescente, sendo um entrave a qualquer processo
de mudança social.
21.2. Modernização, desenvolvimento e
dependência
Progresso
e desenvolvimento talvez sejam as palavras que melhor expressam uma possível
mudança social. Após a Segunda Guerra Mundial percebeu-se que as desigualdades
entre as sociedades eram gritantes. Algumas grandes vertentes teóricas tentaram
explicar por que determinadas sociedades eram desenvolvidas e outras,
subdesenvolvidas.
Teorias da modernização
A
visão evolucionista da história ganhou novo alento com as teorias da
modernização, de acordo com as quais as mudanças movem as sociedades de um
estágio inicial (tradicional) para um estágio superior (moderno), numa escala
de aperfeiçoamento contínuo. Essas teorias utilizam os padrões de análise de
Émile Durkheim e de Max Weber, mas com nova roupagem.
De
acordo com essas teorias, as sociedades são tradicionais ou modernas conforme
as características que adotam. São, portanto, responsáveis pela própria
situação. Para se transformar, passando do estágio atual para o superior, as
sociedades tradicionais (atrasadas e subdesenvolvidas) devem seguir o exemplo e
os mesmos passos históricos das sociedades modernas (industrializadas e
desenvolvidas).
As
teorias da modernização são criticadas por seu caráter etnocêntrico, pois a
maioria das nações não seguiu as mesmas trajetórias históricas que as
sociedades ocidentais. Ademais, tais teorias definem a trajetória de todas as
sociedades como linear, ou seja, presumem que as sociedades modernas, antes
tradicionais, modernizaram-se porque mudaram sua mentalidade e sua maneira de
ver o mundo.
Subdesenvolvimento e dependência
Na
década de 1960, a crítica às teorias da modernização, levaram vários autores a
procurar novas respostas para a questão: por que os países da América Latina
eram subdesenvolvidos e os da Europa e os Estados Unidos eram desenvolvidos? Esses
autores partiram de uma visão que foi elaborada pela Comissão Econômica para a
América Latina (Cepal), da Organização das Nações Unidas.
De
acordo com a Cepal, nas relações econômicas entre países desenvolvidos e
subdesenvolvidos havia uma troca desigual e uma deterioração dos termos de
intercâmbio. Historicamente, cabia aos países periféricos (dominados) vender
aos países centrais (dominantes) produtos primários (agrícolas, basicamente) e
matérias-primas (sobretudo minérios), e comprar produtos industrializados.
Com
essa divisão do trabalho, ao longo dos anos, os países periféricos tiveram de
vender volumes maiores de matérias-primas e mercadorias agrícolas para pagar a
mesma quantidade de produtos industrializados. Ou seja, produziam e vendiam
mais para receber o mesmo e assim enriquecer aqueles que já eram ricos.
O
sociólogo alemão Andrew Gunder Frank afirmava que na América Latina havia
apenas o desenvolvimento do subdesenvolvimento, pois os países centrais
exploravam economicamente os países periféricos e os dominavam politicamente,
impedindo qualquer possibilidade de desenvolvimento autônomo. Essa relação, vigente
desde o período colonial, explicava porque alguns países se desenvolveram e
outros não.
Para
um grupo de sociólogos, do qual participou Fernando Henrique Cardoso, a
dependência dos países da América Latina se aprofundou após a Segunda Guerra
Mundial. Os latino-americanos continuaram a produzir os mesmos bens primários
para exportação até a década de 1960, quando houve uma mudança causada pela
internacionalização da produção industrial dos países periféricos.
A
industrialização dependente configurou-se mediante a aliança entre empresários
estrangeiros e nacionais e o Estado nacional. Os produtos industriais começaram
a ser fabricados nos países subdesenvolvidos porque era mais barato (as matérias-primas
estavam próximas, a força de trabalho era mais barata e o Estado, além de dar
incentivos fiscais, construía a infraestrutura necessária à instalação e ao
funcionamento das indústrias).
Em
países onde havia essas condições, as grandes indústrias estrangeiras se instalaram
e geraram um processo de industrialização dependente, sobretudo da tecnologia
que traziam. Produzir localmente é mais lucrativo que exportar produtos
industriais para os países periféricos. Com isso, além de manter a exploração
anterior, os países centrais exploravam diretamente a força de trabalho das
nações subdesenvolvidas.