O episódio torna-se ainda mais grave quando somado à atuação de Eduardo Bolsonaro em instâncias internacionais. Documentos apontam que o deputado buscou pressionar o governo norte-americano para impor sanções ao Brasil, em nome da defesa política do pai e de seu grupo. Nesse gesto, o “patriotismo” que tantas vezes foi brandido como bandeira revela-se contraditório: a soberania nacional é colocada em segundo plano diante da lógica de fidelidade familiar e ideológica. Trata-se de uma inversão de valores que fragiliza o conceito de nação e submete o interesse coletivo à agenda de um clã.
O papel do pastor Silas Malafaia nesse enredo não deve ser desconsiderado. Sua figura simboliza a interpenetração entre púlpito e palanque, entre religião e poder político, que caracteriza o bolsonarismo. Em nome da fé, legitimam-se estratégias de poder que pouco ou nada dialogam com os princípios democráticos ou com o Evangelho. A tríade “Pai, Filho e Pastor” revela, assim, a formação de uma teologia política própria, marcada menos pela espiritualidade do que pela instrumentalização da crença.
Esses elementos — a disputa familiar, o apelo religioso e a pressão internacional — compõem um quadro no qual o absurdo se naturaliza. O que em qualquer democracia consolidada seria considerado inaceitável aqui é digerido como parte do “normal” da política. E isso talvez seja o aspecto mais preocupante: a banalização de condutas que fragilizam instituições, corroem a confiança pública e reduzem a democracia a um palco de espetáculo grotesco.
Se há uma lição a ser extraída desse episódio, é a de que a democracia não pode ser refém de famílias, igrejas ou interesses estrangeiros. Ela exige instituições sólidas, baseadas no princípio da soberania popular, e não nos vínculos privados de pai e filho ou na bênção de líderes religiosos. O Brasil precisa decidir se continuará refém dessa lógica de clã político-religioso ou se terá a coragem de separar o que é da família, o que é da fé e o que pertence à nação.
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Profº Me. Valter Borges