Podemos
observar os sinais das desigualdades sociais em todos os lugares, todos os
dias. Basta ir às ruas para notar as diferenças nas condições de vida das
pessoas e verificar que um pequeno número delas desfruta de muitos privilégios.
Essas diferenças aparecem, de imediato, em elementos materiais, como a moradia,
as roupas, os meios de locomoção. Mas também se manifestam no acesso à educação
e aos bens culturais, os chamados bens simbólicos.
Normalmente,
as desigualdades se evidenciam no dia a dia pelos contrastes entre a riqueza e
a pobreza, que podemos constatar com os próprios olhos ou mediante as
estatísticas e os meios de comunicação.
Por
que há desigualdades sociais? Quais são as formas de desigualdade existentes?
Como elas se constituíram e como são explicadas? Nesta unidade, vamos refletir
sobre essas questões, focalizando as diversas formas de desigualdade que se
configuraram em diferentes tempos e lugares, inclusive no Brasil.
Capítulo 7 Estrutura social e
estratificação
A
estrutura social se constitui da relação entre vários fatores – econômicos,
políticos, históricos, sociais, religiosos e culturais – que dão feição própria
a uma sociedade. Uma de suas características é a estratificação, ou seja, a
maneira como os indivíduos ou grupos são classificados em camadas sociais e o
modo como se movem de uma camada para outra.
Segundo
o sociólogo brasileiro Octavio Ianni, a estratificação social é determinada
pela forma como se organizam a produção econômica e o poder político.
Entretanto, as estruturas de apropriação (econômica) e de dominação (política)
são influenciadas por elementos como a religião, a etnia, o sexo, a tradição e
a cultura, que interferem nos processos de divisão social do trabalho e de
hierarquização.
A
estratificação e as desigualdades sociais são produzidas historicamente. Isso
significa que elas são geradas por situações diversas e se expressam na
organização das sociedades em sistemas de castas e de estamentos (estudados
neste capítulo) ou de classes (apresentado no capítulo 8).
7.1. As sociedades organizadas em
castas
O
sistema de castas é uma configuração social de que se tem registro em
diferentes épocas e lugares. Na Índia está a expressão mais acabada desse
sistema. Embora legalmente abolido em 1950, o sistema de castas permanece por
força da tradição, mesclando-se à estrutura de classes hoje existente na Índia.
Organizado
há mais de 3 mil anos, esse sistema adora uma hierarquização baseada em
religião, etnia, cor, hereditariedade e ocupação. Esses elementos definem a
organização do poder político e a distribuição da riqueza gerada pela
sociedade.
Na
Índia, há quatro grandes castas:
* A dos brâmides (sacerdotal e superior
às demais);
* A dos xátrias (intermediária, formada
pelos guerreiros, encarregados do governo e da administração pública);
* A dos vaixás (casta dos artesãos,
comerciantes e camponeses);
* A dos sudras (casta dos inferiores, dos
que realizam trabalhos manuais considerados servis).
Os
párias são os que não pertencem a nenhuma casta e vivem fora das regras
existentes.
Não
há mobilidade social em um sistema de castas. Os elementos mais visíveis dessa
imobilidade são a hereditariedade, a endogamia, as regras relacionadas à
alimentação e a proibição de contato físico entre membros de castas distintas.
A
rigidez das regras, no entanto, não é total. Embora proibido, as castas
inferiores adotam costumes, ritos e crenças dos brâmanes, o que cria certa
homogeneidade de costumes entre as castas. Também exemplificam a relativização
das regras os casamentos, não muito comuns, entre membros de diferentes castas.
O
sistema de castas indiano está sendo desintegrado de forma gradativa, sob o
impacto da urbanização, da industrialização, da implantação de cotas de
inclusão para as castas inferiores nas universidades públicas e da introdução
de padrões ocidentais de comportamento.
7.2. As sociedades organizadas por
estamentos
O
que identifica um estamento é um conjunto de direitos e deveres, privilégios e
obrigações, aceitos como naturais e publicamente reconhecidos.
Numa
sociedade estamental, a condição dos indivíduos e dos grupos em relação ao
poder e à participação na riqueza não é somente uma questão de fato, mas também
de direito.
Nas
sociedades do período feudal, a propriedade da terra definia o prestígio, a
liberdade e o poder dos indivíduos: os que não a possuíam eram dependentes
econômica e politicamente, além de socialmente inferiores. A possibilidade de
mobilidade de um estamento para outro existia, mas era muito controlada.
A
relação entre os estamentos caracterizava-se pela reciprocidade. Os servos
tinham obrigações para com os senhores, que, por sua vez, lhes deviam proteção.
A
desigualdade era vista como algo natural: camponeses e servos sempre estiveram
em situação de inferioridade.
Na
França, ao final do século XVIII, havia três estados: a nobreza, o clero e o
terceiro estado, que incluía os demais membros da sociedade – comerciantes,
industriais, trabalhadores em geral etc.
A
pobreza, expressão mais visível das desigualdades, era considerada, na Idade
Media, uma condição de nascença do indivíduo. Havia uma visão positiva dessa
condição, uma vez que despertava a compaixão e a caridade. A concepção da
Igreja Católica, que predominava na Europa Ocidental, postulava que os ricos
tinham obrigação moral de ajudar os pobres.
A
partir do século XVI, quando o indivíduo se tornou o centro das atenções, o
pobre passou a ser visto como uma ameaça social e o Estado “herdou” a função de
cuidar dos pobres, antes atribuída aos ricos.
Na
Inglaterra, com o aumento da produção e do comércio, a pobreza e a miséria
seriam interpretadas como resultado da preguiça e da indolência, já que havia
muitas oportunidades de emprego. Tais afirmações pretendiam que as pessoas se
submetessem às condições de trabalho vigentes.
No
final do século XVIII, com o fortalecimento do liberalismo, outra justificativa
para a pobreza foi formulada: as pessoas eram responsáveis pelo próprio destino
e ninguém era obrigado a dar trabalho ou assistência aos mais pobres.
Dizia-se
que era necessário manter o medo à fome para os trabalhadores realizarem bem
suas tarefas.
Em
meados do século XIX, difundiu-se a ideia de que os trabalhadores eram
perigosos, pois poderiam não só transmitir doenças, já que viviam em condições
precárias de higiene, como se rebelar, se organizar e fazer revoluções,
questionando os privilégios das classes que detinham riqueza e poder.