Discutiremos a ideia de cultura, as características das culturas
e a relação entre os seres humanos, o instinto e a cultura. Todos esses
aspectos são importantes para compreender que o que diferencia os seres humanos
são as culturas e que só nos tornamos humanos quando nos tornamos seres
culturais.
Leia abaixo um texto na qual destacamos como este homem ali
retratado, que age influenciado pela cultura norte-americana, é fruto de intensas,
longas e antigas trocas culturais.
O
cidadão norte-americano desperta num leito construído segundo padrão originário
do Oriente Próximo, mas modificado na Europa Setentrional, antes de ser
transmitido à América. Sai debaixo de cobertas feitas de algodão, cuja planta
se tornou doméstica na Índia; ou de linho ou de lã de carneiro, um e outro
domesticados no Oriente Próximo; ou de seda, cujo emprego foi descoberto na
China. Todos esses materiais foram fiados e tecidos por processos inventados no
Oriente Próximo. Ao levantar da cama faz uso dos “mocassins” que foram
inventados pelos índios das florestas do Leste dos Estados Unidos e entra no
quarto de banho cujos aparelhos são uma mistura de invenções europeias e
norte-americanas, umas e outras recentes. Tira o pijama, que é vestuário inventado
na Índia, e lava-se com sabão que foi inventado pelos antigos gauleses, faz a
barba que é um rito masoquístico que parece provir dos sumerianos ou do antigo
Egito.
Voltando
ao quarto, o cidadão toma as roupas que estão sobre uma cadeira do tipo europeu
meridional e veste-se. As peças de seu vestuário têm a forma das vestes de pele
originais dos nômades das estepes asiáticas; seus sapatos são feitos de peles
curtidas por um processo inventado no antigo Egito e cortadas segundo um padrão
proveniente das civilizações clássicas do Mediterrâneo; a tira de pano de cores
vivas que amarra ao pescoço é sobrevivência dos xales usados aos ombros pelos
croatas do século XVII. Antes de ir tomar o seu breakfast, ele olha a rua através da vidraça
feita de vidro inventado no Egito; e, se estiver chovendo, calça galochas de
borracha descoberta pelos índios da América Central e toma um guarda-chuva
inventado no sudoeste da Ásia. Seu chapéu é feito de feltro, material inventado
nas estepes asiáticas.
De
caminho para o breakfast, para para comprar um jornal,
pagando-o com moedas, invenção da Líbia antiga. No restaurante, toda uma série
de elementos tomados de empréstimo o espera.
O
prato é feito de uma espécie de cerâmica inventada na China. A faca é de aço,
liga feita pela primeira vez na Índia do Sul; o garfo é inventado na Itália
medieval; a colher vem de um original romano. Começa o seu breakfast, com uma laranja vinda do
Mediterrâneo Oriental, melão da Pérsia, ou talvez uma fatia de melancia
africana. Toma café, planta abissínia, com nata e açúcar.
A
domesticação do gado bovino e a ideia de aproveitar o seu leite são originárias
do Oriente Próximo, ao passo que o açúcar foi feito pela primeira vez na Índia.
Depois das frutas e do café vêm waffles, os quais são bolinhos fabricados
segundo uma técnica escandinava, empregando como matéria-prima o trigo, que se
tornou planta doméstica na Ásia Menor. Rega-se com xarope de maple inventado pelos índios das florestas
do leste dos Estados Unidos. Como prato adicional talvez coma o ovo de alguma
espécie de ave domesticada na Indochina ou delgadas fatias de carne de um
animal domesticado na Ásia Oriental, salgada e defumada por um processo
desenvolvido no norte da Europa.
Acabando
de comer, nosso amigo se recosta para fumar, hábito implantado pelos índios
americanos e que consome uma planta originária do Brasil; fuma cachimbo, que
procede dos índios da Virgínia, ou cigarro, proveniente do México. Se for
fumante valente, pode ser que fume mesmo um charuto, transmitido à América do Norte
pelas Antilhas, por intermédio da Espanha. Enquanto fuma, lê notícias do dia,
impressas em caracteres inventados pelos antigos semitas, em material inventado
na China e por um processo inventado na Alemanha. Ao inteirar-se das narrativas
dos problemas estrangeiros, se for bom cidadão conservador, agradecerá a uma
divindade hebraica, numa língua indo-europeia, o fato de ser cem por cento
americano.
(LINTON,
Ralph. O homem: uma introdução à antropologia. 12.
ed. São Paulo: Martins Fontes, 2000. p. 313-314)
O texto nos mostra que aquele homem que se considera cem
por cento norte-americano, na verdade, é fruto de muitos cruzamentos culturais.
Ou seja, se é verdade que o ser humano é fruto de uma cultura e que as culturas
diferem entre si, também é fato que as culturas não são fechadas. No exemplo
dado pelo texto, os gestos e hábitos daquele homem são os de um
norte-americano, mas como não há cultura que exista sem ter contato com outras,
esses gestos, hábitos e costumes resultam de cruzamentos e contatos muitas
vezes longínquos. Por isso, é possível dizer que o ser humano é fruto de uma herança
cultural, pois mesmo os gestos mais
típicos de uma determinada cultura originam-se de ligações,
cruzamentos e contatos
dos quais muitas vezes não temos consciência por serem
distantes no tempo.
As culturas estão constantemente se comunicando, estabelecendo
trocas. Umas influenciam mais do que são influenciadas, mas não há nenhuma que
exista fechada em si. O texto nos mostra que a ideia de cultura como algo fechado
no tempo e no espaço e que não se modifica é, no mínimo, ingênua.
Apesar de podermos falar em uma cultura brasileira,
francesa ou tailandesa, e também de hábitos e costumes partilhados por um povo,
deve-se ter em mente que isso é fruto de um longo processo histórico que
altera-se com o passar do tempo, de acordo com as trocas culturais que são
estabelecidas. Mas o que é cultura? Quais são as características de todas as
culturas? Como elas nasceram? Até onde existe o instinto no ser humano? Essas
são algumas das questões que serão respondidas aqui.
A palavra cultura e a ideia de
cultura
Você provavelmente já perceberam que uma característica do
senso comum é a imprecisão terminológica, ou seja, a falta de uma preocupação
em definir bem o que uma palavra quer dizer. Mas, em ciência, deve-se tomar muito
cuidado ao usar um termo ou um conceito.
E o termo “cultura” é muito difícil de ser definido. Muitas
são as definições de cultura.
Relembramos que parte essencial do desenvolvimento humano é
o nosso processo de inserção nos grupos sociais, ou seja, a socialização. E
que, para existir, os seres humanos precisam estar em constante contato entre
si. Logo, o ser humano é um ser social como o são diversos outros animais que
também precisam viver em sociedade para sobreviver, como os elefantes, as
girafas, os lobos e tantos outros.
Mas há algo que distingue o ser humano dos outros animais,
e este algo é o fato de que somos seres culturais. Ou seja, assim como muitos
outros animais, o ser humano
também precisa viver em sociedade para sobreviver.
Contudo, não é viver em grupo ou passar pelo processo de
socialização que nos diferencia dos outros animais, e sim, o fato de que
construímos e transmitimos culturas, e eles, não. Mas o que é um ser cultural?
Por que isso distingue o ser humano dos outros animais? Para responder a essas
questões, deveremos analisar o significado de cultura e por que ela é o elemento
que nos distingue dos outros animais.
Cultura
é uma palavra que vem do latim, “cultura”, e que significava, até o século
XIII, cuidado com o campo. Depois, passou a significar não mais um estado da
coisa cultivada, mas a ação de cultivar a terra. Já no século XVIII, ela passou
a designar o cuidado de trabalhar algo. Logo, cultura seria tudo aquilo que as
pessoas cultivam (CUCHE, Denys. A
noção de cultura nas ciências sociais.
2. ed. Bauru: EDUSC, 2002). É por isso que se pode falar em uma cultura de
fungos, ou cultivo de fungos. O significado do termo pode variar de uma língua
para outra.
É muito difícil aceitar que aquilo que aprendemos não é
natural, uma vez que o internalizamos de tal forma que se torna quase uma
segunda natureza para nós. Mas, para refletir sociologicamente, é necessário
ter consciência de que “quase nada é natural no ser humano”. Já vimos que, para
pensar sociologicamente, é preciso ter consciência do caráter social, histórico
e cultural de nossas maneiras de agir, pensar e sentir.
Ou seja, o que todos os seres humanos têm em comum é a sua
capacidade de se diferenciar uns dos outros. O que há de natural no ser humano
é a sua aptidão para a variação cultural, a diversidade, a escolha de múltiplos
caminhos.
Comecemos esta discussão, a partir do seguinte
questionamento: O
que você acha que o termo “cultura” pode significar?
·
Cultura
pode significar um conhecimento diferenciado: no senso comum, muitas vezes
associamos o termo “cultura” a uma série de conhecimentos que diferenciam as
pessoas. E por isso é comum dizer “fulano tem cultura, ele leu muitos livros”
ou “aquela é uma pessoa que não tem cultura, pois não sabe nada”, “fulano é
culto”. Nesse sentido, cultura tem a ver com uma espécie de saber que algumas
pessoas adquirem e outras não. Essa forma de entender a cultura está ligada à
raiz da palavra cultura.
·
Cultura
pode ser compreendida como o cultivo de algo: essa outra concepção do termo
“cultura” liga-se ainda mais à sua raiz etimológica. É usada em agricultura
quando se quer falar a respeito de uma plantação. Para se ter uma plantação de
algo, é necessário fazer o cultivo de determinada espécie.
·
Cultura
pode ser entendida como as manifestações artísticas de um povo: como quando se usa o termo “cultura”
nas expressões: “teatro é cultura, cinema é cultura”.
·
Cultura
também pode ser entendida como os hábitos e costumes de um povo: seria aquilo que as pessoas aprendem
como membros de uma sociedade. Ou seja, as pessoas dizem, por exemplo, “os
alemães comem salsicha, pois isso é uma característica de sua cultura”.
Apesar dos múltiplos significados do termo e das inúmeras
variações, podemos dizer, genericamente, que cultura, tanto para a Antropologia
como para a Sociologia, significa tudo
aquilo que o ser humano vivencia, realiza e transmite por meio da linguagem. Ou seja, a cultura está relacionada com
os conteúdos simbólicos da vida. Ou, como alguns diriam, com os mecanismos de controle dos
indivíduos em sociedade, isto é, sistemas de símbolos entrelaçados e
interligados entre si que fornecem para os indivíduos um modo de pensar, de
agir e sentir.
Para discutir de que modo o comportamento humano é regido por
meio de símbolos, leia o texto reproduzido a seguir.
O
comportamento humano é regido por meio de símbolos, que são passados de geração
para geração e que também se modificam. Não há ser humano cujo comportamento
não seja regido por meio de símbolos.
Mas e
os animais? Os animais não são também regidos por símbolos? Na natureza, o
vermelho e o preto muitas vezes não são sinônimos de perigo? Os animais não
transmitem mensagens para os outros animais? Não e sim. Os animais não são
regidos por meio de símbolos, o que não quer dizer que não possam transmitir
mensagens. Eles transmitem mensagens, mas elas são sempre as mesmas para a
espécie, por isso são sinais. Já entre os seres humanos, as mensagens variam de
grupo para grupo, pois são compostas por símbolos socialmente estabelecidos,
que variam de sociedade para sociedade.
O
comportamento dos animais é regido principalmente por meio de sinais, enquanto
o do ser humano é regido predominantemente por meio de símbolos. Os sinais são
organicamente programados, geneticamente transmissíveis e intransformáveis[1].
Diz-se
que o sinal é organicamente programado, porque faz parte da constituição
biológica desses animais se comunicarem da forma como se comunicam. A maioria
dos animais, mesmo quando tirados do seu meio, desenvolve as características da
espécie, ou seja, age como um membro criado pelo grupo, mesmo que tenham sido
separados ao nascer. Já os símbolos são socialmente programados. Uma criança
separada de seus pais ao nascer não agirá como eles, mas, sim, como membro do
grupo que a criou.
Daí
decorre o fato de que o comportamento dos animais é geneticamente
transmissível. Afinal, a maioria deles vai se comportar sempre da mesma forma,
não interessa em qual grupo seja criado. Assim, todos os tigres sempre agirão e
se comunicarão por meio dos mesmos sinais, o castor sempre construirá seus
diques da mesma forma, assim como as abelhas sempre farão suas colmeias do
mesmo jeito. Já o nosso comportamento é regido muito mais pela forma como somos
criados.
O
papel da educação e do aprendizado é fundamental para que um ser humano possa
se desenvolver plenamente. Mas o que cada um deve aprender, como deve se
comportar como membro de um grupo, varia de cultura para cultura.
Por
fim, é possível compreender a partir disso que os sinais entre os animais são
intransformáveis, ou seja, não são passíveis de mudança, pois são transmitidos
geneticamente de geração para geração. Ao passo que, entre os seres humanos, os
símbolos são eminentemente transformáveis, ou seja, variam de cultura para
cultura, de grupo para grupo.
(Elaborado
especialmente para o São Paulo faz escola)
O ser humano, o instinto e a
cultura
Agora é o momento de discutir a relação entre instinto e
cultura. Para ilustrar temos os lobos, por exemplo. Lembre-os de que, por
intermédio dos documentários que vemos na televisão, sabemos que os lobos vivem
em grupo, que há regras em cada grupo e que, inclusive, há um macho que parece
comandá-lo. Logo, entre os lobos, há hierarquia e uma organização social.
Contudo, entre eles não há cultura.
Por que entre eles não há
cultura? Só o ser humano
tem essa capacidade de se projetar em tudo o que faz. Ele projeta seus valores
e suas ideias nos objetos que constrói, deixando vestígios de suas relações
sociais nesses objetos. Ele não se adapta à natureza como os outros animais,
mas a transforma e interage com ela. Só ele tem a capacidade de transformar a
natureza. Os animais sempre se adaptam ao meio ou, então, morrem.
Porque um grupo de lobos – não interessa se habita as
Montanhas Rochosas, nos Estados Unidos, ou se vive do outro lado do planeta, na
Sibéria – sempre agirá e se organizará da mesma forma. Isso porque os lobos
podem se organizar em grupo, mas não têm cultura.
Não há cultura entre os lobos, pois não há tradição viva,
elaborada de geração para geração, que permita tornar única e singular uma dada
sociedade. Uma tradição viva nada mais é do que um conjunto de escolhas. Ter tradição
não significa só viver determinadas regras, pois os animais vivem regras, mas
viver conscientemente as regras. Sob determinadas circunstâncias, os animais
vão sempre agir e reagir da mesma forma. Um grupo de lobos só agirá de forma
diferente em relação a outros grupos se um elemento externo ao grupo
influenciá-lo; caso isso não ocorra, agirá sempre da mesma forma. Se eles mudam
suas regras, fazem isso por mudanças no meio.
Com o ser humano não acontece o mesmo, pois estamos
inseridos em culturas, em tradições. A cada grupo humano corresponde uma tradição
cultural.
Só o
ser humano tem essa capacidade de se projetar em tudo o que faz. Ele projeta
seus valores e suas ideias nos objetos que constrói, deixando vestígios de suas
relações sociais nesses objetos. Ele não se adapta à natureza como os outros
animais, mas a transforma e interage com ela. Só ele tem a capacidade de
transformar a natureza. Os animais sempre se adaptam ao meio ou, então, morrem.
Muitas espécies animais foram extintas porque ocorreram
mudanças na natureza (resultantes ou não da ação do ser humano sobre a
natureza) e essas espécies não conseguiram se adaptar. Com o ser humano isso
não acontece; nós não só nos adaptamos à natureza como também, principalmente, interagimos com ela, transformando-a.
Um animal pode ser criado em outro ambiente e não vai
deixar de ser um animal e de adquirir as características de sua espécie. Por exemplo:
o gato criado por cachorros não latirá. Mas o mesmo não acontece com o ser humano:
transferido para outro ambiente, ele buscará adaptar-se, transformando o meio
que o cerca, criando objetos e símbolos e se transformando também nesse
processo.
Assim, o ser humano, por meio da cultura, não é só um
animal que inventa objetos, mas é capaz de pensar o próprio pensamento, ou seja, ele
inventa a si mesmo como ser humano.
Assim, o mundo humano se desenvolve em um ritmo dialético
com a natureza, ou seja, o ser humano não responde como os animais às mudanças
que ocorrem, pois diferentes culturas encontram diferentes formas de reagir às
mudanças. Pode-se dizer que um animal, à medida que cresce, comporta-se cada
vez mais como um membro de sua espécie. Por exemplo, uma onça cada vez mais se
comporta como onça conforme cresce e se adapta ao meio. Mas não podemos dizer
que um ser humano está se tornando mais ser humano, pois não há uma única
possibilidade de ser humano.
A noção de adaptação, quando referida aos seres humanos, é
mais difícil, pois não há uma única maneira de se adquirir sua humanidade, muito
pelo contrário.
E isso é dado pela cultura. A resposta do ser humano ao
meio é cultural, pois somente nós temos essa capacidade de transformar. Nós somos seres
humanos porque respondemos de modo específico às mudanças. Logo, um ser humano
não se torna apenas mais um ser humano à medida que cresce, mas sobretudo se
torna um brasileiro, um norte-americano, um boliviano, um chinês, um alemão, um
árabe etc.
Verificamos anteriormente que isso se deve à forma por meio
da qual os seres humanos se comunicam. O comportamento dos seres humanos é regido
por símbolos que variam de uma cultura para outra.
Com os animais não acontece o mesmo. É possível dizer que o
ser humano é movido mais pela cultura do que pelos seus instintos.
À
medida que cresce, o ser humano é cada vez menos conduzido
pelos seus instintos e cada vez mais
pela cultura. É claro que o ser humano
é um ser biológico, que depende de uma série de funções vitais: todos os seres
humanos comem, dormem, bebem etc. Entretanto, a maneira de satisfazer essas
diferentes funções biológicas varia de uma cultura para outra.
Assim,
entende-se que o comportamento do ser humano é fruto da interação entre
biologia e cultura.
Tomemos como exemplo a alimentação. Se fôssemos como as
outras espécies, todos nós nos alimentaríamos do mesmo modo, comendo os mesmos
alimentos. É o que acontece com os outros animais. Animais de uma mesma espécie
têm todos o mesmo tipo de alimentação. Todas as focas, por exemplo, se
alimentam dos mesmos alimentos, e, se há uma mudança no seu padrão alimentar,
isso se deve a uma alteração no meio físico e nos alimentos disponíveis e não a
uma escolha do grupo. Como os seres humanos são seres culturais, tudo ocorre de
forma muito diferente:
·
não
nos alimentamos todos com os mesmos alimentos. Somos todos uma única espécie,
mas os diferentes grupos humanos têm formas muito distintas de se alimentar. Alguém
poderia dizer que isso ocorre porque, em diferentes partes do mundo, existem alimentos
que são típicos de alguns lugares e outros que são muito diferentes. O
determinismo geográfico é uma postura equivocada. O ser humano seleciona do
meio o que ele considera servir ou não como alimento. E essa escolha é
culturalmente orientada;
·
devemos
nos lembrar que os mesmos animais e vegetais podem ser encontrados em diferentes
locais do mundo, mas isso não quer dizer que sejam considerados alimentos possíveis
em todos os lugares.
Existem, exemplos de animais e/ou vegetais que são
considerados alimentos em alguns lugares e não em outros. Muitos provavelmente se
lembrarão de que os coreanos comem carne de cachorro e que os chineses comem
escorpiões, além de lesmas e baratas. Lembramos de que muitos dos povos latino-americanos
comem o abacate na sua forma salgada. Em alguns lugares da América Latina, por
exemplo, as crianças levam sanduíches de pão com abacate como lanche para a
escola. Os franceses costumam consumir fígado de pato, ou que judeus não
consomem carne de porco.
Voltando à questão do instinto, pode-se afirmar que o
processo de evolução do ser humano se dá de forma diferente daquele que ocorre com os
outros animais. Isso porque os animais de uma mesma espécie, na medida em que
são guiados pelo instinto, sempre agirão da mesma forma sob as mesmas
condições.
Mas o mesmo não acontece com o ser humano. Isso significa, então, que o
ser humano não tem instinto? Qual será o papel do instinto na vida do ser
humano?
Chegamos, então, a outro ponto. O ser humano é resultado do
meio social em que foi socializado. Se o ser humano fosse mesmo um ser levado
predominantemente pelos seus instintos, todos nós, em uma mesma situação, agiríamos
da mesma forma. Mas não é isso o que acontece, porque, apesar de o instinto ser
o mesmo em todos os lugares, não somos regidos somente pelo instinto.
·
só
o ser humano produz cultura: o
que diferencia o ser humano dos outros animais é o fato de que ele é o único
ser que possui cultura;
·
só
o ser humano acumula experiências e as transmite de geração para geração,
formando uma herança cultural: os
primatas, como sabemos, são os seres que mais se parecem com o ser humano.
Entretanto, ao contrário de nós, que acumulamos e transmitimos nossas
experiências para as sucessivas gerações, os primatas não fazem isso. Eles habitam
as florestas e vivem sempre da mesma forma. O ser humano, por exemplo, não vive
mais em cavernas. Ano a ano, de geração a geração, vamos acumulando experiências
e saberes a respeito da natureza. Algo que não acontece com os outros animais.
Os animais mudam o seu comportamento quando há uma mudança no meio físico, mas
não porque resolvem agir de forma diferente;
·
só
o ser humano renova e transforma seu comportamento: ao contrário dos outros animais, cujo
comportamento se modifica para se adaptar a mudanças do meio físico, o ser humano está sempre renovando e transformando seus comportamentos, independentemente
do meio físico no qual habita. O meio físico pode provocar certas mudanças no
comportamento dos seres humanos, mas isso não é algo que determina a nossa
maneira de agir. É o contato com outros seres humanos e outras culturas que
provoca a renovação e a transformação nos hábitos, costumes e modos de pensar e
de agir dos seres humanos. Somos capazes de partilhar e transmitir a
experiência e temos a habilidade de acumular nossas experiências, enquanto os
outros animais não. E, com isso, transformamos os comportamentos anteriores;
Tudo
isso é o resultado da interação com o meio físico e não só da adaptação. Ou seja,
o ser humano não só reage às adversidades do meio físico, mas também o
transforma e cria novas possibilidades com essa experiência, também se
transformando nesse processo.
·
o
ser humano é guiado mais pela cultura do que pelos seus instintos: isso porque, à medida que cresce, vai
sendo cada vez menos levado pelos seus instintos e cada vez mais orientado pela
cultura. É claro que o ser humano é um ser biológico, que depende de uma série
de funções vitais: todos comem, dormem, bebem. Entretanto, a maneira de
satisfazer essas diferentes funções biológicas varia de uma cultura para outra;
·
o
processo de evolução do ser humano ocorre de forma diferente em relação ao dos outros
animais: um cachorrinho
recém-nascido pode ser criado por uma gata. Mas por mais que a gata procure
ensiná-lo, o cachorro não miará. Ele rosnará, latirá, mas não miará. Ou seja,
nenhuma privação de associação com sua espécie fará do cachorro um gato. Isso
porque o cachorro, assim como os outros animais, é movido primordialmente por
seus instintos e é programado geneticamente para agir como um cachorro. Já com o
ser humano é diferente. Ao nascer, ele é totalmente dependente de outros seres humanos
e dificilmente conseguirá viver afastado deles. E, se um bebê nascido em uma
cultura é adotado por um casal de outra cultura, ele aprenderá a língua e os hábitos
do novo grupo. Não vai agir como seus pais biológicos, ou gostar das mesmas coisas
que eles, mas será influenciado pelos seus pais adotivos. O ser humano, portanto,
é resultado do meio em que foi socializado. Se o ser humano fosse mesmo um ser
guiado predominantemente pelos seus instintos, todos nós agiríamos da mesma
forma em uma mesma situação, e não é isso o que acontece.
Os seres humanos, assim como os outros animais, possuem
instintos. Mas a relação que o ser humano tem com seus instintos é muito diferente
da que os outros animais têm.
Quando nasce, o ser humano é puro instinto, assim com os
outros animais. Se tem fome ou sede, ele chora. Se não gosta de uma comida, ele
cospe. Se tem vontade de satisfazer suas necessidade fisiológicas, ele urina e defeca
onde estiver, pois não consegue se controlar. Mas, ao contrário dos outros
animais, à medida que cresce, o instinto passa a ter um papel secundário na sua
vida, pois aprende que para viver em sociedade é necessário contê-lo.
Dessa forma, as pessoas não defecam ou urinam quando
querem. E, mesmo quando comem algo de que não gostam, geralmente não cospem o
alimento. Um exemplo simples, mas ao mesmo tempo interessante, mostra isso:
digamos que um rapaz foi convidado para comer na casa da jovem por quem tem
sério interesse. Para impressioná-lo, a família dela faz uma iguaria muito
apreciada por todos, mas que o rapaz, ao provar, acha horrível.
Qual seria o instinto do jovem? Cuspir aquela “gororoba”!
Mas isso não quer dizer que ele vá agir de acordo com seus instintos. Ele é
controlado pelo padrão cultural internalizado, segundo o qual seria uma ofensa muito
grande à família da jovem não comer aquilo. E ele, se estiver de fato
interessado na jovem, não apenas comerá o alimento de que não gostou como
provavelmente sorrirá e dirá que o achou “uma delícia”, só para agradar à amada
e seus familiares. Nesse sentido, pode-se dizer que o ser humano, assim como os
outros animais, também possui instinto. Entretanto, conforme passa pelo
processo de socialização, seus instintos são “abafados”, reprimidos pelo padrão
cultural que ele internaliza.
O papel do instinto nos seres humanos deve ser relativizado,
ou seja, que ele não deixa de existir, mas pode ser atenuado e reprimido pela
cultura.
Como
falar em instinto de conservação quando lembramos as façanhas dos camicases
japoneses (pilotos suicidas) durante a Segunda Guerra Mundial? Se o instinto
existisse, seria impossível aos arrojados pilotos guiarem os seus aviões de
encontro às torres das belonaves americanas.
O
mesmo é verdadeiro para os índios das planícies americanas, que possuíam
algumas sociedades militares nas quais os seus membros juravam morrer em
combate e assim assegurar um melhor lugar no outro mundo.
Como
falar em instinto materno, quando sabemos que o infanticídio é um fato muito
comum entre diversos grupos humanos? Tomemos o exemplo das mulheres Tapirapé,
tribo Tupi do Norte de Mato Grosso, que desconheciam quaisquer técnicas
anticoncepcionais ou abortivas e eram obrigadas, por crenças religiosas, a
matar todos os filhos após o terceiro. Tal atitude era considerada normal e não
criava nenhum sentimento de culpa entre as praticantes do infanticídio.
Como
falar em instinto filial, quando sabemos que os esquimós conduziam os seus
velhos pais para as planícies geladas para serem devorados pelos ursos? Assim
fazendo, acreditavam que os pais seriam reincorporados na tribo quando o urso
fosse abatido e devorado pela comunidade.
(LARAIA,
Roque de Barros. Cultura: um conceito antropológico. 23. ed.
Rio de Janeiro: Zahar, 2009. p. 50-51)
O texto é um conjunto de exemplos que ajudam a relativizar
certas ideias do senso comum, tais como a do instinto de sobrevivência, do
instinto materno e do instinto filial. Com esses exemplos não se quis dizer que
o ser humano não tenha instinto, é claro que nós temos. Entretanto, maior do
que o papel do instinto na vida dos seres humanos é a importância dos comportamentos
culturalmente transmitidos, que muitas vezes podem se opor a ele, como foram os
casos dos camicases do Japão, das índias Tapirapé de Mato Grosso e dos esquimós
e seus pais.
O ser humano e a cultura
Trabalhemos aqui com algumas hipóteses de como evoluímos e quais
são as características da cultura. Muitos são os autores que discutiram o tema
da evolução humana e os antropólogos estão de acordo com a ideia de que não há
um mesmo desenvolvimento unilinear (crença de que toda a humanidade passou,
passa e passará por um mesmo processo linear de evolução, ou seja, pelas mesmas
etapas).
Há o consenso de que o que existe é uma evolução multilinear.
Ou seja, de que as diferentes sociedades possuem um desenvolvimento próprio e
não passam todas pelas mesmas etapas.
Um autor que pode nos ajudar a trabalhar criticamente essa
questão é Roberto DaMatta (1987). Para ele, nessa ideia de
desenvolvimento linear há uma concepção teatral da origem do homem, segundo a
qual o seu desenvolvimento se deu por etapas:
a) no primeiro ato, o mundo é um lugar povoado por uma
natureza hostil: animais perigosos e fenômenos naturais como vendavais, tempestades,
glaciações;
b) no segundo ato, aparece o ser humano, apresentado como
um ser solitário;
c) estimulado pelo mundo exterior, o ser humano usa sua
inteligência e começa a aprender pela experiência. Aos poucos, cria artefatos para
enfrentar a natureza e dominá-la;
d) ele vê que precisa se agrupar para lutar contra o mundo
exterior;
e) ele se vê obrigado a inventar instituições para conter
seus impulsos e os dos outros seres humanos: a agressividade leva ao surgimento
das leis e do direito; sua sexualidade leva ao surgimento do casamento, da família
etc.
Segundo DaMatta, esse teatro apresenta dois aspectos
importantes:
·
uma
visão utilitarista da cultura;
·
o
social é um fenômeno secundário, uma simples resposta do ser humano a estímulos
externos.
Quais são os problemas desse teatro?
·
ele
fala do ser humano, quando, na verdade, ele nunca existiu dessa forma
atomizada, sozinho. O que sempre existiu foram sociedades e culturas;
·
ao
tratar do ser humano deixando de lado as culturas e as sociedades, fala-se dele
com generalidade, mas há aí um problema: ao deixar de lado a cultura, deixam-se
de lado as diferenças. E o ser humano só existe na diferença. Não há um ser
humano sozinho;
·
um
terceiro problema é que, ao deixar de lado as diferenças, sugere-se que o ser
humano não reflete, não pensa, que ele só reage ao ambiente natural. E isso não
é verdade:
a) o ser humano
interage com o meio, ou seja, ele não apenas se adapta. Ele écapaz de criar,
inventar, transformar;
b) o ser humano nunca existiu sozinho,
pois ele precisa dos outros seres humanos para existir. Ao nascer é
absolutamente frágil e só se humaniza em sociedade, ou seja, imerso em um grupo
e por meio da incorporação de um sistema de símbolos que são partilhados pelo
grupo e que dizem como ele deve agir. Nesse sentido, não é possível esquecer
que o ser humano só existe na diferença, imerso em um determinado grupo.
O que mais essa visão de um único processo linear de
desenvolvimento para toda a humanidade deixa de lado?
O que se deixa de lado com tudo isso é, na verdade, a ideia
de que os diferentes seres humanos procuram respostas diferentes para os mesmos
problemas e que também, por vezes, cada cultura cria e precisa resolver
problemas e questões particulares que não dizem respeito a outras culturas.
Se fôssemos realmente regidos por leis utilitárias, ou
seja, por uma única lógica do instinto, não existiriam diferenças entre os seres
humanos. Só existiria, portanto, para todos nós, uma única resposta possível
para os problemas de sobrevivência que nos são colocados. Mas existem muitas
respostas. Elas não só existem como também são a base da condição humana.
Tendo compreendido que o ser humano só existe como ser cultural, que o instinto
existe entre nós, mas que é reprimido pela cultura, falta agora finalizarmos discutindo
as características da cultura.
Várias são as características de todas as culturas. Entre
elas é importante destacar que toda cultura é:
a. simbólica: a cultura é um conjunto de
significados sistematizados transmitidos por símbolos e sinais, ou seja, a linguagem.
Podemos tomar como exemplo o coração: como um símbolo, seu significado é
construído de maneira social, histórica e cultural. Logo, pode variar em uma mesma
cultura e entre diferentes culturas. Entre nós é muito usado em propagandas. Em
uma propaganda do Dia dos Namorados, por exemplo, a imagem de um coração
batendo ao lado de duas pessoas entrelaçadas significa amor. Mas o coração em nossa sociedade
também é utilizado como símbolo da vida. Assim, em outra propaganda, cujo
tema é a doação de órgãos, a imagem de um coração batendo não está tão
relacionada apenas ao amor, mas também com a vida, com solidariedade.
b. social: não existe uma cultura individual. Toda
cultura é necessariamente partilhada por um grupo. Ela diz respeito a um
sistema de símbolos socialmente partilhados que ajudam a reger o nosso
comportamento. Por exemplo, o Direito. O Direito reflete as regras do grupo, o
que é importante para aquele grupo, para aquela sociedade. Ele diz respeito a
significados e comportamentos socialmente partilhados e tidos como aceitáveis pela
maioria da população, e que, por serem tão importantes, são codificados na forma
de lei. Caso a lei não faça mais sentido para a maioria da população, ela pode deixar
de fazer parte do Código. Por exemplo, até há algum tempo um homem poderia matar
a sua mulher e alegar legítima defesa da honra. Hoje, isso não é mais aceito
pela maioria da população e essa lei foi retirada do Código Civil. Nenhum homem
tem o direito de matar sua esposa.
c. dinâmica e estável: pode-se dizer que toda cultura é ao
mesmo tempo dinâmica e estável. As culturas são dinâmicas, pois se transformam.
Não há cultura que permaneça estática. Mas é claro que algumas se transformam
mais rápido, outras mais devagar. Entretanto, ao mesmo tempo que as culturas
mudam, pode-se dizer que essa mudança não ocorre diariamente. Existem padrões,
modelos institucionalizados de comportamentos que são considerados aceitáveis e
que não se modificam da noite para o dia. Por essa razão é possível dizer que
elas também são estáveis, pois, durante determinado período (que varia de
cultura para cultura), permanecem as mesmas. Existem duas possibilidades de
mudança cultural: uma que é interna à própria cultura e outra que é o resultado
do contato com outro sistema cultural. Elas mudam, então, devido a fatores
internos ou externos. A mudança por fatores internos à própria cultura é mais
difícil de ocorrer, pois a tendência de uma determinada cultura, quando tem pouco
contato com outras, é a de reproduzir sempre o mesmo padrão. As mudanças culturais
em virtude de fatores externos são mais fáceis de ocorrer. O contato entre
culturas com valores, costumes e modos de vida diferentes pode provocar
transformações culturais. Um exemplo de mudança por fatores externos é o dos
hábitos alimentares dos brasileiros. Na nossa cultura, não havia quase o hábito
de se comer hambúrguer. Mas, como a influência da cultura norte-americana é
grande, isso mudou. Com a entrada de redes de fast-food,
propagandas e a produção de hambúrgueres em larga escala, a preços cada vez
mais baixos, é difícil encontrar pessoas, especialmente as mais jovens, que não
apreciem esse tipo de alimento.
d. seletiva: a cultura está sempre mudando, mas ela
muda de forma seletiva. Cada cultura absorve determinados padrões, mas não
todos com os quais toma contato. É preciso dizer que muitas vezes essa seleção é
inconsciente. Há a tendência de achar que o padrão cultural estabelecido não é um
padrão cultural, mas, sim, um comportamento natural. As pessoas se esquecem de
que outros padrões são possíveis. Para esclarecer essa questão, tome como exemplo
o casamento. Existem muitos padrões possíveis de casamento na humanidade: o de
um homem com uma mulher (monogâmico), o de duas mulheres ou dois homens (homossexual),
o de um homem com mais de uma mulher (poligâmico) e o de uma mulher com mais de
um homem (poliândrico). Na nossa cultura, o único aceito do ponto de vista jurídico,
ou seja, o que é legalmente aceito, é o padrão monogâmico, como o casamento de
um homem com uma mulher, o de duas mulheres e o de dois homens, mas não o
casamento poligâmico ou a poliandria. Já no Irã, é permitido não só o casamento
entre um homem e uma mulher, mas o casamento poligâmico também, enquanto a
poliandria e o casamento homossexual são impensáveis para a sociedade iraniana.
e. determinante e determinada: ao mesmo tempo que a cultura se impõe
sobre o indivíduo, que determina o seu comportamento, o indivíduo pode mudar a
cultura, ou seja, ela pode ser determinada pelo indivíduo. Toda cultura é uma
obra coletiva, mas pode ser modificada e é vivida de diferentes maneiras pelas
diferentes pessoas. Ela não é só uma amarra, ela não só se impõe sobre nós. Nós
também podemos modificá-la, determiná-la. Afinal, apesar de existir um sistema
de símbolos partilhado por todos, as pessoas não se inserem em uma cultura
todas da mesma forma, seja porque cada subgrupo dentro de uma cultura se
relaciona com ela de uma forma diferente, seja porque cada pessoa compreende e
se relaciona com os mesmos padrões culturais de uma maneira única. Caso isso
não ocorresse, todos dentro de uma mesma cultura pensariam da mesma forma, pois
partilhariam valores e símbolos. Mas não é isso o que acontece. Cada indivíduo se
relaciona com o padrão social e culturalmente estabelecido de forma única.
Para encerrar essa discussão, tomemos o exemplo do Direito.
Como vimos, as regras ou as normas sociais mostram o que as pessoas devem e não
devem fazer, na medida em que são expressões de um padrão cultural. Essas
regras ou normas são unificadas e consolidadas na forma de regras jurídicas que disciplinam
as relações dos indivíduos em sociedade, estabelecendo penalidades no caso de seu não
cumprimento. Mas, assim como as regras sociais, as normas do direito não são
somente determinantes, ou seja, não apenas agem sobre nós, elas também são
determinadas por nós e, assim, podem ser modificadas. Uma expressão disso é a
lei do divórcio, que permite a dissolução do vínculo matrimonial e um novo casamento
com outras pessoas. Essa lei veio a alterar a norma social e jurídica que
considerava o casamento como indissolúvel, e foi o resultado da mobilização de
grupos sociais que lutaram pela sua efetivação.
Pode-se resumir o que foi estudado até aqui da seguinte
forma:
·
A
cultura, mais do que a herança genética, determina o comportamento do ser
humano.
·
O ser
humano age de acordo com seus padrões culturais, ou seja, ele é um ser
parcialmente movido pelos instintos. No ser humano, o papel do instinto diminui
conforme ele passa pelo processo de socialização.
·
O ser
humano depende muito mais do aprendizado do que do instinto.
·
Como
não só se adapta ao meio, mas também interage com ele, o ser humano é capaz de
viver sob os mais diversos climas e situações. Assim, ele conseguiu transformar
quase toda a Terra em seu habitat.
·
A
cultura é um processo cumulativo resultante das sucessivas gerações, ou seja, a
experiência vai sendo acumulada com o passar do tempo. Mas isso não quer dizer
que a cultura não seja passível de mudança.
Questões
1. Explique por que há diferença de
comportamento entre os seres humanos e outros animais.
2. Disserte sobre o papel do instinto na
vida do ser humano. Por que, à medida que o ser humano envelhece, os instintos
vão perdendo a importância?
3. As culturas humanas são muito
diferentes entre si. Entretanto, todas as culturas têm algumas características
que as ligam. Explique duas características da cultura e dê um exemplo de cada
característica.
4. Faça uma redação na qual discutam a
relação entre a cultura e o instinto na vida das pessoas.
[1] Leia
mais sobre o assunto em: RODRIGUES, José Carlos. Antropologia
e comunicação: princípios radicais. Rio de Janeiro:
PUC-Rio; São Paulo: Loyola, 2003. (Coleção Ciências Sociais, n. 5).