terça-feira, 27 de março de 2018

A relação entre estabelecidos e outsiders


Introduziremos agora a noção da relação entre “estabelecidos” e “outsiders”. Essa teoria foi cunhada pelo sociólogo Norbert Elias (1897-1990) no livro Os estabelecidos e os outsiders, no qual ele estabelece a análise das tensões ocorridas na pequena cidade de Winston Parva (nome fictício), na Inglaterra. Esse texto é importante porque nos ajuda a compreender e a refletir não apenas sobre a pequena Winston Parva – cujo verdadeiro nome nem sabemos –, mas a pensar o Brasil e algumas das tensões que aqui existem.

O texto de Norbert Elias é muito complexo, e o autor introduz uma série de conceitos que não precisam ser todos discutidos. As possibilidades de pensar os conceitos de estabelecidos e outsiders são muitas.

Apresentaremos algumas informações importantes Norbert Elias que ajudarão a compreender sua obra:

- Norbert Elias nasceu na cidade de Breslau, em 1897, na antiga Alemanha. Atualmente a cidade chama-se Wroclaw e fica na Polônia (mudança ocorrida depois da Segunda Guerra Mundial). Elias, portanto, se considerava alemão e Breslau, uma cidade alemã;

- Era filho de judeus. Primeiro estudou Medicina, depois Filosofia e, por fim, interessou-se pela Sociologia. Com os ânimos exaltados na Alemanha e a Segunda Guerra Mundial quase começando, foi para a Inglaterra com medo das perseguições que já ocorriam na Alemanha;

- Seu primeiro livro foi publicado em 1938 e passou os trinta anos seguintes esquecido;

- Elias viajou por vários países, tendo morado até na África, onde lecionou na Universidade
de Gana;

- Ele sempre foi um outsider na Academia. Ou seja, sofreu preconceito e só conseguiu o reconhecimento pela sua obra tardiamente, quando beirava os setenta anos.

Nessa introdução afirmamos que não foi à toa que ele se interessou por tal tema, pois também foi um outsider em alguns momentos de sua vida. Publicado pela primeira vez em 1965, Os estabelecidos e os outsiders foi escrito em parceria com John L. Scotson. Nele, Elias faz uma análise das tensões entre dois grupos na pequena Winston Parva. A princípio, seu estudo era sobre os diferentes níveis de delinquência encontrados entre o lado mais novo da cidade e o antigo.

Mas, no decorrer da pesquisa, ele mudou seu objeto para as relações entre os bairros. Sua decisão de mudar de objeto se mostrou acertada, pois as diferenças entre os níveis de delinquência praticamente acabaram no terceiro ano da pesquisa. O bairro mais antigo, contudo, continuava a ver a nova área como local de delinquência.

Elias verificou que naquela pequena localidade era possível encontrar um tema universal: como um grupo estabelecido estigmatiza um outro grupo tratando-o como outsider.


O termo outsider não tem uma tradução muito fácil para a língua portuguesa. Literalmente, significa “de fora”, ou seja, alguém que veio de outro lugar e não é membro original de um grupo, não se encaixa muito bem nele. Mas dizer em português que alguém é um “de fora” soa um tanto estranho aos nossos ouvidos. É por isso que o termo não é traduzido e usa-se a expressão em inglês. Na obra Os estabelecidos e os outsiders, Norbert Elias aplica a categoria “outsider” para referir-se aos habitantes mais novos de Winston Parva. No entanto, utiliza também para designar de forma geral os grupos que detêm menos poder. Em contraposição à categoria de “outsider”, Elias denomina os antigos moradores da cidade de “estabelecidos”, que também aplica para designar os grupos que detêm mais poder.


Os estabelecidos consideram-se humanamente superiores. Isto é, os grupos poderosos veem-se como pessoas melhores. A inferioridade de poder é vista como inferioridade humana, e por isso recusam-se a ter qualquer contato maior com os outsiders que não seja o meramente profissional.

Isso ocorre porque os estabelecidos acreditam que são dotados do que Elias chama de “uma espécie de carisma grupal”, um tipo de qualidade que faltaria aos outsiders.

O que acham que levava a isso? Quais fatores podem levar um grupo a hostilizar outro? Com base nos fatores apontados, estabeleceremos relações com as categorias criadas por Elias. Tal relação entre estabelecidos e outsiders normalmente é explicada como resultado de diferenças raciais, étnicas ou religiosas, mas que em Winston Parva os grupos não diferiam entre si pela nacionalidade, ascendência étnica, cor ou tipo de ocupação.

Logo, o que estava em jogo naquela pequena cidade e o que está em jogo numa relação entre estabelecidos e outsiders não é a diferença de cor, religião, ou qualquer outra entre os grupos, mas sim a diferença de poder.

Elias mostrou que o problema não está nessas características que podem diferenciar os grupos, mas no fato de que uns grupos têm mais poder e acham que por isso são melhores do que os outros. Os grupos detentores de mais poder usam essas diferenças porque se veem como superiores. A questão é a diferença no equilíbrio de poder entre eles. Ou seja, em última instância, não é a cor, a religião, a nacionalidade etc., que faz um grupo ver outro como inferior, e sim o fato de que eles detêm maior poder e, assim, usam esses fatores como justificativa para manter esse poder. Isso tanto pode ser feito de forma inconsciente quanto consciente. Ou seja, um grupo pode manipular as características de outro de forma negativa a seu favor, de propósito, como pode fazer isso de forma inconsciente.

No caso da cidade estudada por Elias, a única diferença entre as duas áreas era o tempo de residência: um grupo estava lá havia duas ou três gerações e o outro chegara recentemente. A superioridade não tinha a ver com poder militar ou econômico, mas com o alto grau de coesão das famílias (ELIAS; Scotson, 2000. p. 22).

Desta forma, eles conseguiam se organizar para obter os melhores cargos nas organizações locais, como no conselho, na escola no clube e, assim, excluíam os outros que não tinham coesão entre si. A coesão de um grupo está relacionada ao grau de integração do grupo. Os moradores mais antigos eram, portanto, profundamente integrados.

Questionamos: O que vocês acham que pode levar à integração de um grupo? O que levava a essa integração era a aceitação quase irrestrita das regras do grupo. Ou seja, grupos coesos são aqueles nos quais seus participantes aceitam quase que totalmente as regras do grupo ao qual pertencem.

Concluímos que Elias então percebeu que o grau de coesão de um grupo interfere nas relações de poder entre esse grupo e o resto da sociedade. Pois um grupo coeso pode atingir seus objetivos de forma muito mais rápida e eficaz do que aquele cujo grau de integração é menor.

Por fim, é importante dizer que o grupo outsider é muitas vezes estigmatizado e questionar: O que isso quer dizer? O que significa dizer que um grupo é estigmatizado por outro?

Isso ocorre devido ao grande desequilíbrio de poder. Um grupo só consegue estigmatizar outro quando as relações de poder tendem claramente para o seu lado. Isso expressa o fato de que o equilíbrio de poder entre os grupos é muito instável – afinal, um deles precisa deter muito mais poder do que o outro para ser capaz de estigmatizá-lo, e assim dizer que o outro tem “valor humano” inferior como forma de manter sua superioridade (ELIAS; SCOTSON, 2000, p. 24). Isso só muda quando há alteração no equilíbrio de poder entre os grupos.

Mas o estigma não pode ser confundido com o preconceito, pois a questão não é individual e sim social, ou seja, há diferença entre preconceito individual e estigmatização grupal. A estigmatização é um processo social. Em Winston Parva as pessoas eram estigmatizadas não pelas suas qualidades ou defeitos individuais, mas por serem membros de um grupo malvisto, considerado coletivamente inferior. O grupo dos estabelecidos da cidade havia desenvolvido um estilo de vida e um conjunto de normas partilhadas pelos seus membros, mas tais normas eram desconhecidas pelos moradores da parte nova da cidade.

E para deixar a discussão mais próxima da realidade brasileira, poderíamos lembrar de vários exemplos de grupos estigmatizados em nossa sociedade. Questionar por que esse grupo é considerado estigmatizado. Questionar a quem interessa mantê-lo nessa condição.

A favela, por exemplo. Infelizmente, no nosso país, o morador da favela com frequência é estigmatizado pela sociedade. Muitos acham que todos os que moram na favela são ladrões ou pessoas que não querem trabalhar, entre outras características negativas. Afirme que, com base nesse estigma, muitas vezes o termo “favelado” é usado como forma de xingamento, e não apenas para designar quem mora na favela. É usado entre não favelados para a desqualificação do outro, qualquer que seja ele, favelado ou não.

Trata-se do que Elias chama de “desonra grupal”. Com isso, as pessoas que moram na favela são sistematicamente depreciadas sem ao menos ter chance de mostrar que não se enquadram nesse triste estereótipo – podem, por exemplo, perder oportunidades de emprego por conta disso, – pelo simples fato de pertencerem a um grupo estigmatizado.

É importante concluir a discussão afirmando que o texto de Norbert Elias não ajuda apenas a compreender as tensões na pequena cidade de Winston Parva.

Ele é relevante para que possamos entender as tensões da nossa sociedade, do nosso país e mesmo do nosso bairro. Ele nos ajuda a refletir sobre questões e tensões presentes entre nós, brasileiros, da mesma forma que pode nos auxiliar na compreensão das tensões que ocorrem em outros países ou momentos históricos.

O texto sobre as relações entre os estabelecidos e os outsiders promove a compreensão e a reflexão sobre as relações sociais de uma forma geral.


sexta-feira, 16 de março de 2018

Características do Estado


Apresentaremos aqui o que o caracteriza como entidade ou organização política: a nacionalidade, a soberania e a finalidade. Sem essas características, não existe Estado. E o que significa cada uma dessas características?

Para esclarecer esta questão desenvolveremos uma discussão utilizando como exemplo o caso de Israel e da Palestina.

O texto a seguir ajudará na discussão sobre o tema. O texto também está disponível na seção Leitura e análise


A região da Palestina, situada no Oriente Médio, no lado leste do Mar Mediterrâneo – fazendo divisa com o Líbano, ao norte; a Síria, a nordeste; a Jordânia, a leste; e o Egito, ao sul –, é uma estreita faixa de terra, desértica, sem petróleo e sem recursos minerais estratégicos. Habitada inicialmente, entre outros povos, pelos hebreus, dos quais descendem os judeus, em 2000 a.C., a Palestina esteve sob
o domínio dos mais diversos povos, entre romanos, árabes e, mais recentemente, ingleses.

Os judeus foram expulsos da região durante o Império Romano e então passaram a viver espalhados por vários lugares do mundo. Embora dispersos, os judeus preservaram uma profunda consciência nacional e conservaram suas tradições religiosas e seus costumes. Com o fim do Império Romano e o surgimento do islamismo, no século VII, a Palestina passou a ser dominada pelos árabes. Entre 1517 e 1917, tornou-se parte do Império Otomano[1] e, durante a Primeira Guerra Mundial, passou a ser controlada pelos ingleses. A disputa pelo território palestino remonta ao século XIX, com a emergência de movimentos nacionalistas, entre os quais o movimento sionista em 1897, que propunha o retorno dos judeus à Palestina e a formação de um Estado judaico. A partir dessa época, milhares de judeus passaram a emigrar e a se instalar na região. Com o fim da Primeira Guerra Mundial e o desmembramento do Império Turco-Otomano, a Palestina passou para o controle do Reino Unido e permaneceu sob o domínio britânico até o final da Segunda Guerra Mundial.

Em 1947, uma resolução da Organização das Nações Unidas (ONU) propôs a divisão da Palestina em dois Estados: um judeu (Israel) e outro árabe palestino. Lideranças judaicas apoiaram o plano, mas os árabes palestinos não aceitaram a partilha e, apoiados pela Liga Árabe[2], iniciaram uma guerra civil. Em 14 de maio de 1948, foi proclamada a criação do Estado de Israel. Cinco países da Liga invadiram a Palestina, levando à primeira guerra entre árabes e israelenses. Milhares de palestinos foram obrigados a se refugiar nos países vizinhos. Os israelenses venceram a guerra e anexaram territórios palestinos previstos pela ONU. A partir deste momento, o conflito entre Israel e árabes, especialmente os palestinos, tornou-se constante.

Em 1964, foi fundada a Organização para a Libertação da Palestina (OLP), liderada por Yasser Arafat, voltada para a luta pela criação de um Estado palestino livre. Desde essa época, ambos os povos têm se enfrentado em guerras, confrontos armados, revoltas populares (intifadas) e atos terroristas perpetrados por grupos radicais que não reconhecem a existência do Estado de Israel.

No dia 15 de novembro de 1988, o Conselho Nacional Palestino, o corpo legislativo da OLP, estabeleceu a declaração do Estado da Palestina, embora ele não seja um Estado independente, tampouco detenha soberania sobre quaisquer territórios. O Estado foi reconhecido imediatamente pela Liga Árabe, mas não pelas Nações Unidas.

Em 1993, teve início o Processo de Paz de Oslo3[3], quando a OLP pôde estabelecer a Autoridade Nacional Palestina (ANP), ou seja, uma espécie de governo representando os interesses dos palestinos. O acordo previa que Israel cederia gradualmente o controle dos territórios onde vive a maior parte dos palestinos (a Cisjordânia e a Faixa de Gaza) em troca da paz. Isso implicava o reconhecimento mútuo e a coexistência com o Estado de Israel.

Desde 2003, entretanto, os palestinos encontram-se divididos pelo conflito entre duas facções: o Fatah, o partido majoritário, e o Hamas, grupo político radical. Como resultado, o território controlado pela ANP está seccionado entre a Cisjordânia, controlada pelo Fatah, e a Faixa de Gaza, controlada pelo Hamas, que, apesar de ter vencido as eleições em 2006, não tem sido autorizado a participar das negociações oficiais de paz, por ser considerada uma organização terrorista por Israel e diversos outros países.

Os maiores obstáculos para a constituição efetiva do Estado palestino estão nas violentas disputas entre facções palestinas desde a eleição, em 2006, do grupo Hamas (não reconhecido internacionalmente) e nos constantes ataques de ambos os lados às populações civis em cidades israelenses e da Faixa de Gaza. Essa situação impede as iniciativas em busca de negociações por acordos de paz e a retirada dos assentamentos judeus na Cisjordânia, reivindicadas pelos palestinos.

Atualmente, os destinos da região continuam incertos. Se os palestinos já conquistaram a autonomia em algumas cidades da Cisjordânia e em Gaza, ainda não possuem um Estado independente e soberano. Alguns passos, contudo, têm sido dados nessa direção. O mais importante deles ocorreu em 29 de novembro de 2012, quando a Assembleia Geral da Organização das Nações Unidas concedeu à
Palestina a condição de Estado observador não membro, por 138 votos a favor, 9 contra e 41 abstenções. Isso representa um passo importante, ainda que não definitivo, para que sua condição de Estado seja reconhecida plenamente[4]. Além disso, desde 1996, a Palestina possui um comitê olímpico e, em 1998, a Fifa reconheceu a seleção palestina de futebol como uma entidade independente.

Elaborado especialmente para o São Paulo faz escola.


O que levou à proclamação do Estado de Israel, em 1948?
Não descartamos a hipótese de alguns defenderem a importância de os judeus terem direito a um Estado próprio, tendo em vista o desfecho da Segunda Guerra Mundial e as revelações das atrocidades cometidas nos campos de concentração durante o nazismo. Entre os principais fatores a ser apontados estão:

- o movimento sionista, iniciado em 1897, que propunha a volta dos judeus à “Terra Prometida”, ou seja, à região onde se situava o antigo reino de Judá, em 1200 a.C.;
- o acirramento dos movimentos políticos nacionalistas judaicos após o Holocausto,
decorrentes dos desdobramentos da Segunda Guerra Mundial;
- o fracasso do plano das Nações Unidas em criar dois Estados, em 1947, que levou
Israel a proclamar sua própria independência e delimitar suas fronteiras de acordo com seus próprios interesses, entre os quais a firme resolução de garantir um território seguro para o estabelecimento de uma nação judaica.

O que houve com os árabes palestinos que viviam na região?
De acordo com o texto, milhares de palestinos foram obrigados a se refugiar nos países vizinhos. Veja:

- segundo a ONU, aproximadamente 700 mil palestinos deixaram suas aldeias, vilas e cidades de origem durante a guerra árabe-israelense de 1948. Hoje, esses refugiados e seus descendentes chegam a 4,25 milhões de pessoas;
- os países onde vivem essas pessoas não reconhecem os refugiados como cidadãos. Atualmente, eles podem ser considerados “apátridas”, uma vez que não são cidadãos israelenses, tampouco jordanianos, sírios, egípcios, libaneses ou sauditas;
- um dos grandes pontos de disputa entre israelenses e palestinos desenvolve-se em torno do direito de retorno dos refugiados que deixaram suas casas em 1948 e em 1967 (quando um segundo conflito levou a um novo movimento emigratório) aos seus locais de origem, inclusive de seus familiares e descendentes. A questão é se os palestinos devem ter o direito às suas propriedades originais ou se estabelecer somente na Cisjordânia ou na Faixa de Gaza.

A partir dessas duas questões, já pode desenvolver melhor esse tema, ou seja, os elementos que caracterizam o Estado. Rememoremos a seguinte questão: O que tornou possível a existência do Estado de Israel?
Alguns podem afirmar que o fato de ter vencido a guerra contra os países da Liga Árabe e ter conquistado mais territórios foram fatores fundamentais para a consolidação do Estado de Israel. Outros, ainda, destacam o papel dos Estados Unidos da América (EUA) como apoiadores e aliados dos israelenses.

Porém, os elementos constitutivos a ser assinalados são:

- população: não se podem esquecer os milhares de judeus que haviam emigrado para a região desde os primórdios do movimento sionista, no final do século XIX;
- território: a conquista de um território e a delimitação de fronteiras foram fundamentais para o estabelecimento do Estado de Israel, em 1948;
- governo: a formação e a organização de um governo, desde a declaração da independência do Estado, unificaram o país imediatamente.

Lembrando os três aspectos que caracterizam um Estado como entidade ou organização política, sem os quais ele não pode existir: a nacionalidade,
a soberania e a finalidade, analisaremos a questão palestina.


Elementos que caracterizam o Estado

- Nacionalidade: está baseada na ideia de nação, que “está intimamente ligada também à cultura de um povo, cultura esta que se constrói através do tempo e se delineia em grande parte em função dos acontecimentos históricos que marcaram a caminhada daquele povo”1[5].

- Soberania: deve ser entendida de duas formas: 1) como sinônimo de independência, ou seja, quando um Estado, especialmente seu próprio povo, afirma-se como soberano, isto é, não mais submisso a qualquer potência estrangeira; 2) como expressão de poder jurídico mais alto, ou seja, dentro dos limites jurídicos e territoriais do Estado, este é quem tem o poder de decisão em última instância, isto é, exerce o poder soberano ou o poder máximo. Um Estado, para ser verdadeiramente soberano, só reconhece um tipo de soberania: a) una, b) indivisível, c) inalienável e d) imprescritível. O que isso significa?

a) Significa que a soberania deve ser una, porque, em um mesmo Estado, não se admite a convivência de duas soberanias (mais de um poder superior no mesmo âmbito).
b) A soberania do Estado deve prevalecer sobre todo e qualquer assunto. Por essa razão, é considerada indivisível, não sendo admissível a existência de várias partes separadas da mesma soberania.
c) Ela é inalienável, ou seja, não pode ser retirada; do contrário, quem quer que a detenha (seja o povo, a nação ou o Estado) desaparece quando ficar sem ela.
d) Finalmente, é imprescritível, isto é, não tem prazo para terminar; do contrário, quem quer que a detenha (seja o povo, a nação ou o Estado) desaparece quando ela termina.

- Finalidade: o fim ou o propósito do Estado é o bem comum, entendido como o conjunto de todas as condições de vida social que permitam e favoreçam o desenvolvimento das pessoas que vivem naquele território, sob aquele governo em particular.

Elaborado especialmente para o São Paulo faz escola.


É importante lembrar que o povo judeu, embora estivesse espalhado em diversos países, manteve laços de reconhecimento e união por meio de sua cultura, sua língua, suas tradições e sua religião, e foi com base nessa identidade que pôde construir uma ideia de nação.

O Estado de Israel, além de independente, detém a soberania política e jurídica sobre os territórios proclamados sob sua jurisdição e domínio militar. Você pode chamar a atenção para as particularidades apresentadas a respeito do conceito de soberania.

Exercícios:
A partir da leitura do texto sobre o conflito entre Israel e palestinos, responda:
1) Considerando-se apenas os elementos constitutivos do Estado, os palestinos detêm as condições necessárias para formar um Estado próprio?
2) Em 1988, o Conselho Nacional Palestino declarou a existência do Estado da Palestina. Porém, diversos países não reconhecem a existência desse Estado. Considerando-se as características do Estado, por que a Palestina ainda não se constituiu efetivamente como Estado? Justifique sua resposta.
3) Leia a afirmação a seguir:
“O Estado é o responsável pela organização e pelo controle da sociedade, pois é o único que pode manter forças armadas (Exército e força policial) e tem legitimidade ou autoridade para impor a ordem pela força (monopólio legítimo do uso da força e da coerção)”.
Com base no que foi debatido a respeito das características do Estado, desenvolva um texto dissertativo relacionando seu papel como responsável pelo controle e pela organização social com as noções de soberania e finalidade do Estado.



[1] Império que existiu entre 1299 e 1922 e que em seu apogeu se estendeu pela Anatólia – região que hoje corresponde à Turquia –, pelo Oriente Médio, por parte do sudeste europeu e pelo norte da África. Foi estabelecido por uma tribo de turcos oguzes no oeste da Anatólia e era governado pela dinastia Osmanli, de onde deriva o nome “otomano”.
[2] Egito, Iraque, Jordânia, Líbano, Arábia Saudita e Síria.
[3] Possui esse nome porque foi realizado na capital da Noruega.
[4] Fonte de dados: ONU. Assembleia Geral da ONU concede status de Estado Observador não membro à Palestina. Disponível em: . Acesso em: 20 dez. 2013. 
[5] DE CICCO, Cláudio; GONZAGA, Álvaro de A. Teoria Geral do Estado e Ciência Política. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2008. p. 53-54.

Organização política de um país


Apresentamos uma primeira formulação geral do conceito de Estado, além de serem abordados seus principais elementos constitutivos e suas características. O objetivo é estabelecer uma distinção clara entre a noção geográfica e política de Estado da Federação (Estado de São Paulo, da Bahia, do Tocantins, por exemplo) e o conceito teórico de Estado, cuja definição é oriunda da Teoria Geral do Estado.

Essa discussão servirá de base para desenvolver uma reflexão sobre as noções políticas de país/nação, território, soberania, povo e governo. Todos esses elementos constituem a base conceitual de uma sociedade politicamente organizada e são o ponto de partida para a compreensão do funcionamento das instituições democráticas e do exercício dos direitos políticos.

Conceito de Estado e seus elementos constitutivos


O Estado de São Paulo fazer parte de um conjunto de Estados que compõe o Brasil. Você sabe qual é o nome oficial do Brasil? O nome oficial do país é República Federativa do Brasil. O que esse nome significa? O Estado de São Paulo faz parte de uma entidade maior, ou seja, de uma República Federativa chamada Brasil. Essa entidade maior é o que entendemos por país, em termos de sua delimitação geográfica, e por Estado, em termos de sua organização política. Em outras palavras, o Estado de São Paulo faz parte de uma Federação de Estados[1], cujo tipo de governo é uma República[2], que é a República Federativa do Brasil ou o Estado brasileiro.


Uma definição abrangente de Estado seria “uma instituição organizada política, social e juridicamente, ocupa um território definido e, na maioria das vezes, sua lei maior é uma Constituição escrita. É dirigido por um governo soberano reconhecido interna e externamente, sendo responsável pela organização e pelo controle social, pois detém o monopólio legítimo do uso da força e da coerção”.

DE CICCO, Cláudio; GONZAGA, Álvaro de A. Teoria Geral do Estado e Ciência Política. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2008. p. 43.


- Em primeiro lugar, o Estado é uma instituição que possui uma organização interna;
- Para existir, depende de um território, ou seja, de um espaço geográfico definido;
- Geralmente é organizado segundo leis escritas, como em uma Constituição;
- Além disso, é dirigido por um governo reconhecido internamente por sua população e externamente por outros Estados (ou países);
- Finalmente, o Estado é o responsável pela organização e pelo controle da sociedade, pois é o único que pode manter forças armadas (Exército e força policial) e tem legitimidade ou autoridade para impor a ordem pela força (monopólio legítimo do uso da força e da coerção), conforme prerrogativas da legislação vigente e dispostas no contrato social (Constituição) de cada Estado.

Para ficar mais claro, leia o seguinte trecho, reproduzido no Caderno do Aluno, em que estão explicitados, de forma sucinta, os elementos constitutivos do Estado:


O Estado é uma sociedade de pessoas chamada população, em determinado território, sob a autoridade de determinado governo, a fim de alcançar determinado objetivo, o bem comum.

DE CICCO, Cláudio; GONZAGA, Álvaro de A. Teoria Geral do Estado e Ciência Política. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2008. p. 43.



Elementos do Estado
Materiais
Formal
População
Território
Governo

É importante distinguir população de povo:

- “Integram a população todas as pessoas residentes dentro do território estatal ou todas as pessoas presentes no território do Estado, num determinado momento, inclusive estrangeiros e apátridas”[3]. Em outras palavras, a população abrange o conjunto de pessoas que vivem no território estatal ou mesmo que permaneçam nele temporariamente. Segundo o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), a população brasileira era de aproximadamente 200 milhões de habitantes em 2013.

- Nas democracias atuais, o povo adquire um sentido político, uma vez que está ligado à noção de cidadania e, para isso, depende de estar ligado ao Estado por meio do status da nacionalidade. “Povo, em sentido democrático, pressupõe a totalidade dos que possuem o status da nacionalidade, os quais devem agir, conscientes de sua cidadania ativa, segundo ideias, interesses e representações de natureza política”[4].

Também é interessante destacar que o território de um Estado não consiste apenas nas fronteiras nacionais, mas em um conjunto de partes que vão além da superfície terrestre, tais como:

- solo: porção de terras delimitadas pelas fronteiras internacionais e pelo mar;
- subsolo: porção de terras sob o solo, com a mesma delimitação deste;
- espaço aéreo: coluna imaginária de ar que acompanha o contorno do território terrestre, somado ao mar territorial;
- embaixadas: sedes de representação diplomática dos diversos Estados, que são consideradas parcelas do território nacional nos países estrangeiros;
- navios e aviões militares: são considerados parte do Estado referente ao país a que pertencem, e em qualquer lugar que estejam;
- navios e aviões de uso comercial ou civil: que estejam sobrevoando ou navegando em território não pertencente a outros Estados;
- mar territorial: estende-se por 12 milhas marítimas (22,2 km) para defesa militar e 200 milhas marítimas (370 km) para exploração econômica.

Segundo o IBGE, a área territorial oficial do Brasil é de 8.515.767,049 km2[5].
Finalmente, é preciso compreender em que consiste o governo. Governo não é o mesmo que Estado, mas sim o poder do Estado, divididas em funções, geralmente representadas pelos Poderes Executivo, Legislativo e Judiciário.


Os vereadores municipais, deputados estaduais, deputados federais e senadores exercitam a função legislativa, investidos em seus mandatos. Prefeitos, governadores e presidente da República, a exemplo de outros, exercem o poder de administrar, garantir a segurança do território, lançar impostos sobre a população, realizar obras que beneficiem tal população em matéria viária, educacional, sanitária ou cultural, ou ainda executam atividades de fiscalização e controle (o chamado poder de polícia), exercitam o poder (e a função) executivo. Por fim, juízes, desembargadores e árbitros, entre outros, com o poder de julgar, de acordo com as leis vigentes, os conflitos na esfera pública ou privada, exercem o poder judiciário.

DE CICCO, Cláudio; GONZAGA, Álvaro de A. Teoria Geral do Estado e Ciência Política. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2008. p. 45.



Exercícios:

1. Quais são os Poderes do Estado?
2. Identifique dois cargos associados a cada um dos Poderes e dê exemplos de suas atribuições.
a) Poder Executivo.
b) Poder Legislativo.
c) Poder Judiciário.



[1] Uma Federação consiste em uma união perpétua e indissolúvel de Estados autônomos, mas não soberanos, regidos por uma Constituição. São Federações o Brasil, os Estados Unidos da América, a Argentina e a Venezuela, por exemplo.
[2] Forma de governo na qual o povo é soberano, governando o Estado por meio de representantes investidos nas suas funções em poderes distintos. Fonte: Dicionário Houaiss da língua portuguesa. Edição eletrônica. Rio de Janeiro: Objetiva, 2007.
[3] SOARES, Mário L. Q. Teoria do Estado: novos paradigmas em face da globalização. São Paulo: Atlas, 2008. p. 143.
[4] Ibidem, p. 45.
[5] e Fonte: IBGE. Disponível em: .
Acesso em: 15 abr. 2014

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