O
objetivo é debater a questão da violência escolar, estimulando a refletir, de
forma crítica e construtiva, sobre essa que é uma das problemáticas que mais
têm mobilizado educadores, diretores de escola, professores, funcionários,
formuladores de políticas públicas, pais e alunos. Longe de propor soluções e
esgotar as explicações para um problema de natureza complexa, por meio da
interação entre professor e alunos, as questões pertinentes ao meio escolar sejam
discutidas de modo a propiciar debates e estimular a formulação de propostas
para a superação de conflitos.
A
conscientização do papel de alunos e professores como atores responsáveis pelos conflitos
escolares é o primeiro passo para a transformação das relações sociais no
ambiente escolar.
A
violência escolar é hoje considerada um dos principais problemas do sistema
educacional, não apenas no Brasil, mas em diversos outros países. Porém, embora
seja uma questão que influencia o cotidiano de muitas escolas, ela não pode ser
tratada da mesma maneira, como se todas as instituições vivessem igualmente os
mesmos problemas. Cada escola possui suas peculiaridades, suas qualidades e
seus conflitos,
e não cabem aqui generalizações. Por essa razão, antes de falar de violência escolar,
é preciso mapear a situação vivida em cada contexto particular para, somente
então, partir para uma reflexão crítica.
É
importante um levantamento dos conflitos vivenciados no espaço da sua escola
para analisar essa temática.
1.
Nos últimos 12 meses, você ou algum dos seus colegas viu alguma dessas
situações acontecendo dentro da sua escola ou bem perto dela (próximo aos
portões, ou em volta do quarteirão da escola, do lado de fora)?
Situação
|
Sim
|
Não
|
Não
sei
|
a)
Pessoas agredindo-se verbalmente (xingando, usando palavrões).
|
|
|
|
b)
Pessoas brigando, agredindo-se fisicamente.
|
|
|
|
c)
Pessoas portando armas perfurocortantes (canivetes, estiletes, facas, navalhas).
|
|
|
|
d)
Pessoas portando armas de fogo, que não fossem policiais em serviço.
|
|
|
|
e)
Pessoas ameaçando ou intimidando professores.
|
|
|
|
f)
Pessoas ameaçando ou intimidando funcionários.
|
|
|
|
g)
Pessoas consumindo ou vendendo drogas ilegais (cocaína, crack,
maconha).
|
|
|
|
h)
Pessoas sendo ameaçadas ou intimidadas.
|
|
|
|
i)
Professores ameaçando alunos.
|
|
|
|
j)
Professores agredindo alunos verbalmente (xingando, usando palavrões).
|
|
|
|
k)
Professores agredindo alunos fisicamente.
|
|
|
|
l)
Funcionários ameaçando alunos.
|
|
|
|
m)
Funcionários agredindo alunos verbalmente (xingando, usando palavrões).
|
|
|
|
n)
Funcionários agredindo alunos fisicamente.
|
|
|
|
o)
Pessoas destruindo o patrimônio coletivo da escola, como carteiras, janelas,
portas, telefone público, bebedouros, banheiros etc.
|
|
|
|
p)
Pessoas pichando paredes, muros, carteiras, lousas, janelas, banheiros etc.
|
|
|
|
q)
Pessoas sendo atacadas sexualmente.
|
|
|
|
r)
Pessoas sendo mortas por agressão (briga) ou arma de fogo.
|
|
|
|
s)
Alunos agredindo professores verbalmente (xingando, usando palavrões).
|
|
|
|
t)
Alunos agredindo funcionários verbalmente (xingando, usando palavrões).
|
|
|
|
u)
Alunos agredindo professores fisicamente.
|
|
|
|
v)
Alunos agredindo funcionários fisicamente.
|
|
|
|
2.
Nos últimos 12 meses, alguém fez com você, na escola ou próximo a ela, alguma
destas coisas?
Situação
|
Uma
vez
|
Algumas
vezes
|
Muitas
vezes
|
Nenhuma
vez
|
Não
sei
|
a)
Ofendeu, humilhou ou xingou você.
|
|
|
|
|
|
b)
Praticou uma brincadeira que fez você se sentir mal, triste ou envergonhado.
|
|
|
|
|
|
c)
Ameaçou bater, empurrar ou chutar você.
|
|
|
|
|
|
d)
Bateu, empurrou ou chutou você.
|
|
|
|
|
|
e)
Ameaçou você com faca ou arma de fogo.
|
|
|
|
|
|
f)
Esfaqueou você ou atirou em você.
|
|
|
|
|
|
g)
Ameaçou machucá-lo de outras formas, ou seja, sem a utilização de facas ou
armas de fogo.
|
|
|
|
|
|
h)
Falou mal de você sem ter razão.
|
|
|
|
|
|
i)
Escreveu algo impróprio sobre você em sites de
relacionamento ou pichou isso em paredes ou muros da escola.
|
|
|
|
|
|
3.
Responda se você já se sentiu rejeitado ou discriminado por causa de algum dos
fatores a seguir:
Situação
|
Uma
vez
|
Algumas
vezes
|
Muitas
vezes
|
Nenhuma
vez
|
Não
é o
meu
caso
|
Não
sei
|
a) Pela
sua aparência.
|
|
|
|
|
|
|
b)
Por sua condição financeira.
|
|
|
|
|
|
|
c)
Pelo seu local de moradia.
|
|
|
|
|
|
|
d)
Pela escola onde estuda.
|
|
|
|
|
|
|
e)
Pela cor de sua pele ou por sua etnia.
|
|
|
|
|
|
|
f)
Pela sua religião.
|
|
|
|
|
|
|
g)
Por ser de outro país/Estado/cidade/bairro.
|
|
|
|
|
|
|
h)
Por ter vindo de outra escola.
|
|
|
|
|
|
|
i) Por
ser mulher.
|
|
|
|
|
|
|
j) Por
ser homossexual.
|
|
|
|
|
|
|
k)
Por ter alguma deficiência ou doença crônica.
|
|
|
|
|
|
|
l)
Por ter dificuldades de aprendizagem.
|
|
|
|
|
|
|
m)
Por ter repetido de ano.
|
|
|
|
|
|
|
n)
Por outro fator.
|
|
|
|
|
|
|
j)
Amedrontou ou perseguiu você.
|
|
|
|
|
|
|
k)
Ameaçou você de morte.
|
|
|
|
|
|
|
l)
Furtou ou roubou suas coisas.
|
|
|
|
|
|
|
m)
Ameaçou pessoas próximas a você (amigos, parentes, namorado ou namorada).
|
|
|
|
|
|
|
Conflitos
na vivência escolar
A
violência na relação entre alunos e professores, alunos entre si e alunos e
funcionários não é um fenômeno novo na escola. O que se vive hoje é, na
realidade, uma grande mudança na forma de perceber os atos de violência. Algumas
décadas atrás eram considerados “normais” e aceitos como parte do processo disciplinatório
do ensino as punições físicas ao aluno, na forma de puxões de orelhas, reguadas,
golpes de palmatória e outros castigos vexatórios, como a repetição de frases escritas
dezenas de vezes, os xingamentos e a estigmatização perante a turma pelo mau desempenho
ou comportamento.
Hoje,
a indisciplina (conversas fora de hora, descumprimento de tarefas, discussões, brigas),
um fato antes corriqueiro e integrado à vida da escola, passou a ter outra dimensão.
Outras formas de violência têm se tornado cada vez mais comuns dentro
e fora do
espaço da escola (no seu entorno): vandalismo, agressões físicas, ameaças de
morte e até mesmo casos de violência que resultam em óbito de professores,
funcionários e alunos. Vivencia-se o conflito entre a dificuldade de dar
andamento às aulas e “disciplinar” os alunos e a necessidade de introduzir
novas práticas pedagógicas e didáticas que superem antigos modelos
de ensinar e aprender.
E
como explicar esses fenômenos?
As causas apontadas são várias, desde
as sociais, tais como a vigência de políticas públicas de exclusão social que
não oportunizam o acesso a uma educação de qualidade e trabalho digno, até
causas psicológicas que convertem a baixa autoestima em respostas antissociais
que se descortinam como única alternativa de sobrevivência, aceitação e
autoafirmação, a exemplo da formação do poder paralelo do narcotráfico.
(MARRA, Célia A. S. Violência
escolar – A percepção dos atores escolares e a repercussão no
cotidiano da escola. São Paulo: Annablume, 2007. p. 25)
Não
é o propósito deste texto, entretanto, aprofundar essa discussão, mesmo porque
não haveria espaço para isso. Cabe distinguir, claramente, de que tipo de violência
estamos falando, a quem ela se dirige, e que consequências ela traz para o cotidiano
da escola. O objetivo é realizar um trabalho de conscientização a partir do
qual eles consigam formular suas próprias percepções sobre o problema, sempre
com base no princípio do estranhamento.
Há
uma variedade de atos perpetrados no cotidiano escolar que são geradores de
conflito. Porém, não necessariamente qualificamos todas essas ações como
violência. As atitudes muitas vezes encaradas como “indisciplinadas”, como o
uso reiterado de palavrões, as respostas às provocações dos colegas – que,
muitas vezes, redundam em agressões físicas – e a postura contestatória de
alguns alunos, fazem parte, na realidade, do processo interativo dos
adolescentes e jovens. Trata-se, antes, mais de agressividade
do que de violência propriamente dita. Os atos violentos,
diferentemente, incorporam um desejo de destruição em relação ao outro (Freire,
1994 apud Marra, 2007, p. 38).
Um
problema mais sério que surge no relacionamento entre os alunos ocorre quando apelidos,
brincadeiras, agressões e fofocas passam do limite e se tornam uma atitude deliberada
no sentido de “zoar”, “sacanear” e humilhar colegas, que são discriminados por
uma série de razões, como as exemplificadas na atividade anterior. Esse
fenômeno, denominado bullying,
pode levar crianças, adolescentes e jovens a um grande sofrimento. Geralmente,
as vítimas de bullying sentem-se
isoladas. Por se sentirem discriminadas, sofrem de baixa autoestima e chegam a
ter o rendimento escolar prejudicado por causa do medo que os colegas
praticantes do bullying lhes
provocam. O bullying pode se tornar extremamente violento,
chegando até mesmo a causar lesões físicas e transtornos psicológicos sérios.
O termo bullying
– sem tradução na língua portuguesa – compreende todas as
formas de atitudes agressivas, intencionais e repetidas, que ocorrem sem
motivação evidente. São adotadas por um ou mais estudantes contra outro(s),
causando dor e angústia, e executadas dentro de uma relação desigual de poder.
Porém,
no cotidiano escolar também são evidenciados atos violentos não direcionados de
forma sistemática e reiterada a um colega em particular. As ações violentas,
entre as quais se incluem as brigas, as ameaças (inclusive as de morte) e as
lesões corporais, seguidas ou não de morte, podem ocorrer entre alunos que não necessariamente
são vítimas sistemáticas de bullying.
As brigas e ameaças ocorrem pelos mais variados motivos de desentendimento, boatos,
fofocas, disputas, rivalidades e, especialmente, como forma de revidar uma
ofensa. Em muitos casos, os pais dos alunos também ameaçam os próprios filhos
cotidianamente e incentivam a reação violenta como forma de defesa no
relacionamento com os colegas.
Os
conflitos vivenciados no cotidiano escolar, muitas vezes, não se encontram
circunscritos ao espaço da escola: várias brigas têm início dentro da sala de
aula e continuam nos portões, ou começam na vizinhança e continuam dentro da
classe, exatamente porque a escola não está isolada das relações da comunidade na
qual está inserida. Nesse sentido, as ameaças contribuem para o aumento da
violência, especialmente nas localidades onde há relações com grupos de poder
ligados ao narcotráfico.
São frequentes as ameaças de alunos
para com seus colegas, invocando o nome de irmãos e outros parentes, em geral
ligados ao tráfico de drogas, e, portanto, conhecidos e temidos pelos outros.
(MARRA, Célia A. S. Violência
escolar – A percepção dos atores escolares e a repercussão no
cotidiano da escola. São Paulo: Annablume, 2007. p. 130)
O
ponto a ser discutido com os alunos é a atitude violenta em relação a outros colegas.
Considerando as diferenças entre meninos e meninas é possível distinguir as
atitudes consideradas menos aceitáveis. O
objetivo é provocar a reflexão sobre as ações violentas que os alunos tomam em relação
aos colegas, mas não aceitam que sejam tomadas quando se trata deles mesmos, e
sobre de que forma essas atitudes podem gerar um círculo vicioso de violência
no espaço escolar.
Violência
escolar: o papel de cada um
Pode
parecer, pela discussão desenvolvida, que o aluno é o único responsável pela
violência no cotidiano escolar; porém, as relações conflituosas se dão não
apenas entre colegas, mas entre todos os membros participantes da estrutura da
escola: diretores, coordenadores pedagógicos, inspetores de alunos, professores
e demais funcionários. Nesse sentido, cabe uma breve discussão sobre o papel de
cada um nesse cotidiano.
É
muito importante identificar quais são as maiores queixas, formular hipóteses sobre
a origem dos conflitos e discutir o assunto para saber quais seriam algumas
possíveis soluções. Utilize as informações a seguir para complementar a
discussão.
Uma
pesquisa realizada em 2009 pela Faculdade de Economia e Administração da
Universidade de São Paulo, a pedido do Instituto Nacional de Estudos e
Pesquisas Educacionais (Inep) e da Secretaria de Educação Continuada,
Alfabetização e Diversidade (Secadi)[1],
em 501 escolas públicas do país, envolvendo 18 599 estudantes, pais, mães,
professores e funcionários, mostrou que o preconceito e a discriminação estão fortemente
presentes na escola pública. As principais vítimas de preconceito são os
portadores de necessidades especiais, os negros, os homossexuais e os pobres[2].
A
atitude discriminatória dentro e fora da sala de aula, inclusive por parte de
pais e educadores, contribui para o baixo desempenho e para a reprodução da
violência escolar. O aluno que se sente estigmatizado por qualquer razão dentro
da sala de aula e fora dela não desenvolve qualquer relação positiva com a
atividade escolar e deixa de aprender. Para ele, abandonar ou destruir a escola
e desrespeitar os colegas e o professor são a forma de exteriorizar o
sofrimento de não se sentir no mesmo direito de estar ali.
A educação é um processo interativo,
em que a subjetividade do educador se mistura com a subjetividade do educando,
buscando um entendimento, uma linguagem unificada a partir das diferenças. Então,
esse educador necessita se conhecer, se dominar, e ter uma consideração
positiva do outro, especialmente quando esse outro traz em si as marcas dos
estigmas, e já não tem muito o que esperar da sociedade e da escola.
(MARRA, Célia A. S. Violência
escolar – A percepção dos atores escolares e a repercussão no
cotidiano da escola. São Paulo: Annablume, 2007. p. 124)
Por
essa razão, a interação entre educador e educando não pode prescindir da afetividade
e da confiança que facilitam o diálogo, atributos exatamente opostos ao medo, à
desconfiança, ao revide ou ao silêncio induzido pela ameaça.
As
pesquisas sobre violência escolar desenvolvidas por sociólogos e educadores no
contexto brasileiro têm chegado a resultados semelhantes quando analisam as
motivações para os conflitos entre educadores e educandos. Por um lado, é
possível afirmar que parte das dificuldades enfrentadas pelos alunos, em termos
de expectativas e rendimento, tem a ver com as trajetórias escolares de seus
familiares mais próximos; ou seja, em ambientes familiares em que
tradicionalmente não há o hábito do estudo ou os pais não tiveram a
oportunidade de completar a escolaridade básica,
os alunos têm mais dificuldade de encontrar apoio para realizar suas tarefas,
estudar e melhorar seu desempenho. Por outro lado, práticas pedagógicas
desinteressantes e relacionamento inadequado (muitas vezes, marcado por
preconceitos, atitudes autoritárias e sem sentido para os alunos) são apontados
como fatores que propiciam atitudes antissociais que evoluem para a violência propriamente
dita entre professores e alunos.
Questões:
1.
Elabore um projeto de resolução de
conflitos, com os seguintes itens:
·
na primeira parte, o grupo deverá
redigir um texto que explique quais são os principais problemas vivenciados na
escola e procurar desenvolver algumas explicações para eles;
·
segunda parte, deverá identificar
quais são as principais práticas relacionadas à violência escolar e de que modo
elas interferem no seu cotidiano, no processo de aprendizagem e crescimento;
·
na terceira parte, deverá apresentar
suas propostas de como esses conflitos poderiam ser solucionados, e qual é seu
papel, como alunos, em contribuir para diminuir a violência na escola.
2.
Elabore uma redação narrando um caso
(fictício ou real) de violência escolar, em que sejam explicitados os fatores
que levaram à ocorrência, o episódio propriamente dito e as consequências,
indicando de que maneira o conflito foi solucionado (ou não) e o que pode ter
contribuído para isso.
[1] Atual
Secretaria de Educação Continuada, Alfabetização, Diversidade e Inclusão, do Ministério
da Educação (MEC).
[2]
Fonte de dados: IWASSO, Simone; MAZZITELLI, Fábio. Escola é
dominada por preconceitos, diz pesquisa. O
Estado de S. Paulo, 18/06/2009. p. A19.