sábado, 14 de abril de 2018

Como Lula conseguiu mudar a narrativa da sua prisão

Que Lula há muito tempo deixou de ser homem e se tornou uma instituição é consenso à direita e à esquerda. O que está em jogo, em disputa, é o significado da instituição, o que ela representa.

Lula é o maior corrupto da história do Brasil ou a principal liderança popular que esse país já teve?

A disputa está ai. No atual estado da situação não sobrou muito espaço para meio termo. Ou é uma coisa ou é a outra. Cada um que escolha seu lado.

Na condição de instituição, todo gesto de Lula tem dimensão simbólica, é lido e interpretado por todos, por detratores e admiradores. Lula pega o microfone e o país paralisa em frente à TV. Os admiradores choram. Os jornalistas a serviço da mídia hegemônica silenciam. Ninguém fica indiferente a uma instituição desse tamanho.

Lula sabe perfeitamente que está sendo observado, conhece muito bem o tamanho que tem e explora com extrema habilidade sua capacidade de fabricar símbolos. 

Aqui neste ensaio, trato de uma parte muito pequena da biografia de Lula, mas que talvez seja, na perspectiva simbólica, a mais importante. Talvez seja até mais importante que os oito anos de seu governo.

Falo das 34 horas em que Lula esteve no sindicato dos metalúrgicos, sob os olhares do mundo, construindo a narrativa de seu próprio martírio.

Não falo em “resistência”, pois desde a condenação no Tribunal da Quarta Região, em 24 de janeiro, que o destino de Lula já estava selado. Os advogados cumpriram sua função, recorrendo a todos as instâncias e tentando um habeas corpus, mas todos já sabiam que Lula seria preso.

Por isso, seria ingênuo dizer que o que aconteceu em São Bernardo do Campo foi um ato de resistência. Lula é um político experiente demais para resistir em causa perdida.

Alguns companheiros e companheiras, no auge da emoção, tentaram usar a força. Lula fugiu da custódia dos trabalhadores e se entregou à Polícia Federal, pois sabe que contra o braço armado do Estado ninguém pode. Lula sabe que aqueles que ali estavam eram trabalhadores e trabalhadoras, pais e mães de família. Não eram soldados. Não eram guerrilheiros. A resistência não era possível.

Lula sabe que seria impossível sustentar aquela mobilização durante muito tempo e por isso não resistiu. Mas daí a se entregar resignado como boi manso para o abate a distância é grande, muito grande.

Penso mesmo que Lula fez mais que resistir, já que a resistência seria quixotesca, irresponsável. Lula pautou a própria prisão, saiu da posição de simples condenado pela justiça para se tornar o dono da narrativa. Lula foi sujeito do próprio encarceramento, deu um nó nas forças do golpe neoliberal.

Muitos achavam que Lula deveria ter fugido para uma embaixada amiga e de lá partido para o exílio no exterior. Confesso que também pensei assim. Mas Lula é muito mais inteligente que todos nós juntos.

Lula sabe que já viveu muito, sabe que não lhe sobra muito tempo de vida. O que resta agora é a consolidação da biografia, o retorno às origens, seu renascimento como ícone da esquerda brasileira, imagem que ficou um tanto maculada pelos oito anos em que governou o Brasil.

É que no capitalismo não existem governos de esquerda. Governo de esquerda só com revolução e Lula nunca foi revolucionário, nunca prometeu uma revolução.

Todo governo legitimado pelas instituições burguesas será sempre burguês. No máximo, no melhor dos cenários, será um governo de centro sensível às demandas populares. O lulismo foi exatamente isso: uma prática de governo de centro sensível às necessidades dos mais pobres. O lulismo transformou o Brasil pra melhor, com todos os seus limites, com todas as suas contradições.

Mas para encerrar a vida em grande estilo carece de algo mais. Era necessária a canonização política. E só a esquerda canoniza líderes políticos. A direita é dura, cinza, sem poesia.

O golpe neoliberal conseguiu reconciliar Lula com as esquerdas, o que há poucos anos parecia algo impossível de acontecer.

É que pra ser canonizado pelas esquerdas nada melhor que ser perseguido pelo poder judiciário, habitat histórico das elites da terra. Basta lançar no google os sobrenomes da maioria dos nossos juízes, procuradores e desembargadores e veremos os berços de jacarandá que embalaram os primeiros sonhos dos nossos magistrados.

É claro que Lula não planejou a perseguição. É óbvio que ele não queria ser perseguido. Se pudesse escolher, estaria tendo um final de vida mais tranquilo, talvez afastado da política doméstica e atuando nas Nações Unidas. Mas já que a vida deu o limão, por que não espremer, misturar com açúcar, cachaça, mexer bem e mandar pra dentro?

Lula fez exatamente isso: uma caipirinha com os limões azedos que seus adversários togados lhe deram.

Primeiro, ele fez questão de esgotar todos os mecanismos legais. A sentença de Moro, os votos dos desembargadores, os votos dos Ministros da Suprema Corte não são palavras ao vento. São “peças”, para falar em bom juridiquês, que ficarão arquivadas e disponíveis para a consulta, para análise.

Imaginem só, leitor e leitora,  os historiadores que no futuro, afastados da histeria e das disputas que hoje turvam nossos sentidos, examinarão a sentença de Sérgio Moro,  verão que o juiz não foi capaz de determinar em quais “atos de ofício” Lula teria beneficiado a OS para fazer por merecer o tal Triplex do Guarujá.

É como se Moro estivesse falando: "não sei como fez, mas que fez, ah fez".

E o voto dos desembargadores do TRF 4, atravessados de juízos de valor, quase sem relar no mérito da sentença?

E o voto de Rosa Weber? Por Deus, o que foi aquele voto de Rosa Weber?

“Sei que estou votando errado, mas vou continuar votando errado só porque a maioria votou errado. Uma maioria que só vai votar porque eu vou votar errado também.”

Lula, ao se negar a fugir, obrigou cada um desses togados a deixar impressos na história os rastros da própria infâmia.

Uma vez decretada a prisão, o que fez Lula?

Deu um tiro no peito? Se entregou em São Paulo? Foi pra Curitiba? Fugiu?

Não!

Lula se aquartelou no sindicado mais simbólico da redemocratização brasileira, o sindicado que representa as expectativas que nos 1980 apontavam para um Brasil mais justo, mais solidário.

No apogeu da crise que significa o colapso do regime político fundado na redemocratização, Lula decidiu encenar o seu martírio onde tudo começou.

Naquele que talvez seja o último grande ato de sua vida pública, Lula voltou às origens.

Protegido pela massa de trabalhadores, Lula não cumpriu o cronograma estipulado por Sérgio Moro. Cercado por uma multidão, o Presidente operário transformou o sindicato dos metalúrgicos numa embaixada trabalhista.

A Polícia Federal, o braço armado do governo golpista, disse que não usaria a força. A Polícia Federal sabia que o povo resistiria, que sem negociação não tiraria Lula do sindicado sem deixar uma trilha de sangue.

Lula negociou e, nos limites dados por sua posição de condenado pela justiça, venceu e humilhou a instituições ocupadas pelo golpe neoliberal.

Lula não estava foragido. O mundo inteiro sabia onde ele estava e mesmo assim o Estado brasileiro não foi capaz de prendê-lo no prazo determinado pela justiça golpista. Durante um pouco mais de 30 horas, Lula foi um exilado dentro do Brasil, como se São Bernardo do Campo fosse um República independente, a "República Popular dos Trabalhadores".

Lula fez de uma missa em homenagem a Dona Marisa Letícia um ato político e aqui temos mais um lance simbólico do Presidente operário: restabeleceu as pontes entre a esquerda brasileira e a Igreja Católica, aliança que tão importante nos anos 1970, quando sob as bênçãos da Teologia da Libertação foi fundado o Partido dos Trabalhadores.

No palanque, junto com o Padre, estavam Lula e as futuras lideranças da esquerda brasileira. Lula dividiu seu epólio em vida, tomou pra si esse ato mórbido ao abençoar Boulos, Manuela e Fernando Haddad.

Lula unificou em vida a esquerda brasileira. Não só unificou, mas  pautou, apresentou o programa, cantou o caminho das pedras.

Lula deixou claro que o povo mais pobre precisa comer melhor, precisa consumir, viajar de avião, estudar na universidade. Lula, o operário que durante a vida inteira foi humilhado por não ter diploma de ensino superior, foi o professor de milhões de brasileiros que sonham com um país melhor.

É como se Lula estivesse dizendo: “num país como o Brasil, a obrigação mais urgente da esquerda é transformar o Estado burguês em agente provedor de direitos sociais”.

Lula discursou durante uma hora em rede nacional, se defendeu das acusações. Não foi uma defesa para a justiça, mas sim para o tribunal moral da nação. Não foi um discurso para o presente. Foi um discurso para a história.

Não, meus amigos, acuado pelas forças do atraso, Lula não deu um tiro no próprio peito.

Lula mandou trazer cerveja e carne e fez um churrasco com seus companheiros e companheiras. Foi carregado pelos seus iguais, foi tocado, beijado. Saliva, suor, pele.

Lula não deu um tiro no próprio peito.

Getúlio é gigante, sem dúvida, mas também era herdeiro das oligarquias. Lula é o único trabalhador que, vindo da base da sociedade, conseguiu governar e transformar o Brasil. Lula já é maior que Getúlio.

Diferente de Getúlio, Lula entrou pra história sem precisar sair da   História.

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Rodrigo Perez  Oliveira, professor de Teoria da História

terça-feira, 10 de abril de 2018

Afinal, o que é Fascismo?

Há uma confusão, muitas vezes difundida propositalmente, entre fascismo e partidos ou correntes políticas de direita. O fascismo, sem dúvida, tem posições de extrema-direita, mas a maioria das correntes de direita não é fascista.

Afinal, o que é o fascismo? O fascismo na Itália e o nazismo na Alemanha foram movimentos que surgiram nas décadas de 1920-30 como resposta do capitalismo à onda revolucionária que se seguiu após a Revolução Russa de 1917.

Esses movimentos cresceram porque a revolução foi vitoriosa na Rússia, mas, no resto da Europa, foi derrotada e perdeu força. Por isso, chegou-se a um impasse entre as forças revolucionárias e as reacionárias.

O fascismo surgiu com o objetivo de romper esse impasse pela força e decidir a luta a favor da ditadura do capital. A base social desses movimentos eram pequenos comerciantes arruinados pela crise econômica e pequenos e médios agricultores em dificuldades, isto é, a pequena-burguesia.

Para atingir esse objetivo, foram organizados grupos paramilitares fortemente armados com recursos fornecidos pelos grandes capitalistas. Assim, atacavam o movimento operário com métodos de guerra civil. Como explicou Nahuel Moreno, fundador da LIT-QI: “todo governo fascista se caracteriza precisamente por esmagar – com métodos de guerra civil e se apoiando na mobilização da classe média desesperada e do lumpemproletáriado – a classe trabalhadora com suas organizações sindicais e partidos. Essa é a clássica definição trotskista do fascismo para distingui-la de um governo ultrarreacionário que, embora exista, não é fascista”.

Esses bandos armados realizaram ataques armados às manifestações operárias, assassinatos, invasão e destruição de sedes de sindicatos, incêndios. Seu objetivo era destruir a organização independente da classe trabalhadora.

Na Itália, a organização paramilitar fascista nasceu em torno das “esquadras de ação” e, depois, dos Camisas Negras. Na Alemanha, foram primeiro os Freikorps e, depois, as SAs (“tropas de assalto”).

Os movimentos fascistas buscavam chegar ao poder principalmente pela via armada, como aconteceu na Itália com a Marcha sobre Roma organizada pelo Partido Fascista, ou com a tentativa fracassada do golpe de Munique, impulsionada por Hitler. A participação eleitoral desses partidos era apenas um complemento dessas ações armadas.

Na América Latina, também teve a atuação de organizações fascistas. Foi o caso da Argentina, durante o governo de Isabelita Perón (1975-1976), quando foi organizado um grupo fascista, financiado pelo próprio governo, chamado Alianza Anticomunista Argentina (a famosa Triple A). Esse grupo assassinou várias centenas de ativistas operários e militantes de partidos de esquerda. ...

Por Bernardo Cerdeira

A truculência é uma forma fascista de evitar o confronto de ideias. Para os fascistas, o debate é nocivo à sua forma de domínio, de controle absoluto da sociedade, pois pressupõe a existência do opositor.

sábado, 7 de abril de 2018

O ser humano é um ser social


O objetivo é apresentar aos alunos a ideia de que o ser humano é um ser social que se encontra inserido em um conjunto de redes sociais mais amplas (família, amigos, comunidade religiosa, vizinhança, colegas de trabalho etc.). É como parte integrante desses grupos sociais que o ser humano adquire sua identidade e os meios fundamentais para sua  sobrevivência. A partir dessa percepção, deslocaremos o foco para o meio social em que vive o ser humano: a sociedade. Trata-se de propiciar ao educando o estranhamento de si mesmo com relação ao espaço (onde), à temporalidade (quando) e ao modo como vive, atentando para tudo o que os indivíduos produzem e que faz deles seres humanos e sociais.
Selecionamos duas propostas para análise do ser humano como ser social:
a) Trechos da obra Robinson Crusoé, de Daniel Defoe;
b) Exibição de trechos do Filme Náufrago, de Robert.
Observação da obra Robinson Crusoé, de Daniel Defoe
Após a leitura da obra Robinson Crusoé, de Daniel Defoe, como meio a partir do qual procuraremos despertar a reflexão sobre a concepção do ser humano como um ser social.
Nosso objetivo é introduzir os conteúdos acerca do ser humano como ser social.
Autor: Daniel Defoe nasceu na Inglaterra, em 1660, filho de burgueses de origem holandesa. Educado como protestante e dotado de grande espírito crítico, escrevia e distribuía panfletos criticando o rei católico Jaime II e, posteriormente, a rainha Ana, que procurou renovar a Igreja Anglicana. Por essa razão, foi preso duas vezes. Em sua vida, viajou para Portugal e Espanha, onde aprendeu sobre a vida nas colônias portuguesas e espanholas na América. Escreveu também O capitão Singleton, O coronel Jack, Roxana, O capitão Carleton e sua obra-prima As aventuras e desventuras de Moll Flanders.
Obra: escrita em 1719, Robinson Crusoé é a obra que o tornou famoso. O romance foi inspirado na história verídica de um marinheiro escocês que, por quatro anos, viveu isolado na Ilha de Juan Fernandez, no Caribe. O livro conta a vida do jovem inglês Robinson Kreutznaer, logo conhecido como Robinson Crusoé. Tendo gosto por aventuras, torna-se marinheiro e experimenta toda sorte de peripécias, chegando, inclusive, a viver por algum tempo no Brasil. Em uma expedição malsucedida rumo à África, o navio em que viajava encalha e o bote salva-vidas naufraga com todos a bordo. Crusoé é o único sobrevivente e passa a viver sozinho em uma ilha desabitada, utilizando apenas os recursos que consegue salvar dos destroços do navio encalhado e sua própria engenhosidade para produzir as ferramentas e os utensílios necessários à sua sobrevivência durante os anos em que vive na ilha.
Análise da Leitura da obra Robinson Crusoé
Robinson Crusoé
Andei sem rumo pela costa, pensando nos meus amigos, todos desaparecidos, com certeza mortos. O mar transformara-se em túmulo, além de carrasco.
Longe, mar adentro, o navio continuava imóvel, encalhado. Eu estava molhado, sem água e sem comida. Nos bolsos, apenas uma faca, um cachimbo e um pouco de tabaco. A noite avizinhava-se. Afastada da praia, encontrei uma pequena fonte de água doce. Matei a sede. Para enganar a fome, masquei um naco de fumo. Sem abrigo, sem armas e com medo de feras selvagens, subi numa árvore para passar a noite. Consegui encaixar o corpo cansado no meio de grossos galhos, sem perigo de cair durante o sono. Adormeci logo. (p. 23) [...]
O navio, trazido pela tempestade, havia se deslocado para um ponto bem próximo à praia. Continuava inteiro, sinal de que, se tivéssemos permanecido a bordo, estaríamos agora todos com vida. (p. 23) [...] Em primeiro lugar salvei os animais domésticos que viajavam no navio: um cachorro e quatro gatos. (p. 24) [...] Rapidamente fiz uma revista geral para ver o que podia salvar da carga. [...] Já havia decidido trazer do navio todas as coisas possíveis de serem transportadas. Sabia não ter muito tempo: a primeira tempestade faria o barco em pedaços. (p. 25) [...] Ia para bordo a nado e voltava sempre com uma nova jangada, aproveitando para salvar assim também o madeirame do navio. Consegui desse modo valiosas “riquezas” para um náufrago: machados, sacos de pregos, cordas, pedaços de pano encerado para vela, três pés de cabra, duas barricas[1] com balas de mosquete[2], sete mosquetes, mais outra espingarda de atirar chumbo, uma caixa cheia de munições, o barril de pólvora molhada, roupas, uma rede, colchões e - surpresa! – na quinta ou sexta viagem, quando já acreditava não haver mais provisões a bordo, encontrei uma grande reserva de pão, três barris de rum e aguardentes, uma caixa de açúcar e um tonel[3]de boa farinha... (p. 25-26) [...]
Meu futuro não parecia tão bom... Na verdade prometia ser triste, com poucas esperanças de salvação. Sozinho, abandonado numa ilha deserta, desconhecida e fora das rotas de comércio, não alimentava a menor perspectiva de sair dali com vida. Já me via velho e cansado, passando fome, sem forças para nada: morreria aos poucos. Isto se eu não morresse antes, vítima de alguma tragédia.
Muitas vezes deixei-me levar pelo desânimo. Não foram poucas as lágrimas que salgaram meu rosto. Nessas ocasiões, recriminava e maldizia a Deus. Como podia Ele arruinar suas criaturas de modo tão mesquinho, tornando-as miseráveis, deixando-as ao completo abandono? (p. 29) [...]
Depois de dez dias, fiquei com medo de perder a noção do tempo. Improvisei um rústico, mas eficiente calendário. [...] Todos os dias, riscava no poste um pequeno traço. De sete em sete dias, fazia um risco maior para indicar o domingo. Para marcar o final do mês, eu traçava uma linha com o dobro do tamanho. Dessa forma, podia acompanhar o desenrolar dos dias, conseguindo situar-me no tempo.
Entre tantos objetos, havia trazido do navio tinta, papel e penas para escrever. E, enquanto a tinta durou, mantive um diário, relatando de forma resumida os principais fatos acontecidos. (p. 30) [...] A falta de ferramentas adequadas tornava alguns serviços extremamente demorados.
Mas, afinal, para quê pressa? Eu não tinha todo o tempo do mundo? [...] Também descobri que o homem pode dominar qualquer profissão que queira... Aos poucos, tratei de deixar mais confortável o meu jeito de viver. (p. 31) [...]
Foi nessa época que fiquei doente, com febre, e tive alucinações. Vendo a morte muito próxima, fui incapaz de ordenar minhas ideias e colocá-las com clareza no papel. Hoje sei que esse período foi um dos piores da minha vida. A febre veio de mansinho. (p. 36) [...] Num momento de lucidez, entre um ataque e outro de febre, lembrei-me de que, no Brasil, se usava fumo para curar a malária. E eu tinha, num dos caixotes, um pedaço de fumo em rolo e algumas folhas ainda não defumadas. Foi a mão de Deus que me guiou. Buscando o fumo, achei uma Bíblia, guardada no mesmo lugar.
O fumo curou-me a febre: não sabia como usá-lo, por isso tentei diversos métodos ao mesmo tempo. Masquei folhas verdes, tomei uma infusão de fumo em corda com rum, aspirei a fumaça de folhas queimadas no fogo. Não sei qual dos métodos deu resultado: talvez todos juntos. A verdade é que sarei em pouco tempo. A Bíblia foi um bom remédio para a alma. (p. 37) [...]
Sempre quis conhecer a ilha inteira, ver cada detalhe dos meus domínios. Acreditei que tinha chegado a hora. Peguei minha arma, uma machadinha, uma quantidade grande de pólvora e munições, uma porção razoável de comida e pus-me a caminho, acompanhado de meu cão... (p. 42) [...] Na volta, apanhei um filhote de papagaio. Os colonos brasileiros costumavam domesticá-los e ensiná-los a falar. Pensei em seguir-lhes o exemplo. (p. 43) [...]
Foi no início da estação das chuvas. Passando perto da paliçada[4], num canto em que o rochedo projetava sua sombra, meus olhos fixaram-se em pequenos brotos germinando. Nunca tinha visto aquelas plantinhas ali. Curioso, aproximei-me e acreditei estar presenciando um milagre: uma ou duas dúzias de pezinhos de milho surgiam da terra. Era milho e da melhor espécie, não havia d􀃙vida. (p. 32) [...] Reconhecido, agradeci à Divina Providência por mais esse cuidado. Só passado algum tempo é que me lembrei de um fato acontecido dias antes. Precisava de algo para guardar restos de pólvora. Procurando no depósito da caverna, achei um velho saco de estopa. Pelos vestígios, no passado servira para armazenar grãos: no seu fundo havia cascas e migalhas de cereais. Para limpar o saco, sacudi esses restos num canto, perto da cerca: milagrosamente haviam germinado! (p. 33) [...]
Precisava de algo para moer o milho e transformá-lo em farinha. Sem instrumentos para fazer um pilão de uma pedra, fiz um de madeira, usando a mesma técnica que os índios brasileiros empregavam na confecção de suas canoas: queimavam a madeira, escavando-a, a seguir, com a plaina[5]. [...]
Poll, meu papagaio, aprendera a falar e acompanhava-me aonde quer que eu fosse. Fazia-me bem ouvir outra voz além da minha: pena não ser de algum homem. (p. 54) [...]
© DEFOE, Daniel. Robinson Crusoé. Adaptação de ZOTZ, Werner. São Paulo: Scipione, 2010.
Diálogos sociológicos sobre Robinson Crusoé
A questão de número 4, por exemplo, teve como objetivo chamar a atenção para o fato de que Robinson Crusoé, embora estivesse vivendo em condições precárias na ilha, não direcionava toda a sua energia apenas para a satisfação de suas necessidades vitais, mas manifestava certos comportamentos distintamente humanos, como a manutenção de um calendário e o exercício da sua prática religiosa, por meio da leitura da blia. Esses elementos são importantes componentes de sua identidade humana.
Já a questão de número 5 teve por objetivo destacar a importância dos conhecimentos adquiridos no Brasil no episódio do ataque de malária. A
partir dela, você pode situar a personagem com relação aos seus grupos sociais de origem e aos demais grupos sociais com que conviveu, enfatizando a importância da interação com os outros para a sobrevivência do ser humano.
Aqui, buscaremos, a partir de uma discussão mais aprofundada da obra, realizar
com os alunos uma reflexão a respeito da questão central: o ser humano é um ser social. Para isso, utilizaremos a situação enfrentada por Robinson Crusoé, procurando identificar os sentimentos e as atitudes da personagem nos diversos episódios da narrativa, para construir essa ideia de forma gradativa. Por essa razão, propomos um formato dialogal, em que o raciocínio é construído com a participação de todos. Seu papel é oferecer as bases para essa reflexão.
Que objeto vocês considerariam indispensável ter em mãos, caso se encontrassem em uma ilha deserta? Por quê? E se, por acaso, vocês se encontrassem em uma ilha deserta sem absolutamente nada?
O objetivo dessa pergunta é provocar a reflexão sobre a capacidade de sobrevivência do ser humano em condições adversas.
Você acha que Robinson Crusoé “deu sorte” por ter conseguido resgatar diversos objetos do navio encalhado?
Ressalta-se que, em nenhum dos casos, ele tinha todas as condições adequadas
para viver como um europeu do século XVII, do modo como estava habituado.
Vocês acham que conseguiriam sobreviver se dispusessem exatamente dos mesmos recursos que Robinson?
Temos de atentar para o fato de que Robinson Crusoé:
·    era marinheiro, portanto, estava habituado a trabalhar com madeira, cordas, barcos e velames (conjunto de velas que ajudam a impulsionar o navio com a força do vento), que faziam parte do seu dia a dia no navio;
·        tinha conhecimentos sobre o uso de armas de fogo com pólvora (mosquete);
·        sabia como abater e esfolar animais, além de fazer fogo (sem fósforos ou isqueiros) para assá-los e se alimentar deles;
·      vivera em contato com indígenas no Brasil e conhecia melhor a natureza do que muitos de nós, que vivemos em cidades e não estamos habituados a cultivar a terra e a caçar animais.
Mesmo com tudo o que salvara do navio, ele não dispunha de ferramentas adequadas a todas as atividades que precisava desenvolver para tornar sua vida mais confortável na ilha, como cultivar a terra e ter onde cozinhar e armazenar alimentos.
O que o ajudou a superar esses obstáculos?
Essa pergunta tem por objetivo levar a reflexão sobre o fato de que não basta ter utensílios e ferramentas para transformar a natureza, é preciso saber utilizá-los e ter conhecimento da sua fabricação, seu uso e sua manutenção.
No caso de Robinson é um exemplo interessante da união entre conhecimentos de origens diversas: consigo trouxe para a ilha o conhecimento que detinha como europeu, inglês, protestante, marinheiro, alfabetizado e, ao mesmo tempo, aquilo que aprendera nos anos em que vivera no Brasil como plantador de tabaco, tanto com os colonizadores portugueses como com os nativos brasileiros. Foi essa herança cultural que tornou possível a transformação dos recursos retirados da natureza em meios para sua sobrevivência. Pensando dessa forma, reflitamos:
Você acha que Robinson Crusoé encontrava-se realmente isolado na ilha desabitada em que vivia?
Fisicamente sim, mas na realidade ele estava culturalmente ligado à sociedade europeia de onde viera e, também, às comunidades de colonizadores e indígenas brasileiros com quem vivera no Brasil, por meio da herança cultural que lhe foi legada.
Você acha que Robinson Crusoé teria sobrevivido sem os conhecimentos que ele havia trazido da Europa e do Brasil?
O instinto de sobrevivência do ser humano é extremamente forte. Talvez ele tivesse sobrevivido, mas certamente não viveria da forma como viveu na ilha. Seu modo de vida refletia seu passado em sociedade: marcava os dias em um calendário (pensava no passado, presente e futuro), escrevia um diário, lia a blia, usava roupas, sentava-se à mesa para comer e beber, entre outros exemplos. Pensando dessa forma você acha que é possível identificar a origem de Crusoé aonde, quando e como ele vivia, observando o seu modo de vida?
Sim, pois os seres humanos são tanto produtores de cultura como produtos de sua própria cultura. É observando os artefatos deixados pelos povos do passado que os arqueólogos, por exemplo, procuram entender de que maneiras diferentes grupos humanos viviam no passado.
Imagine que não tivéssemos acesso ao diário de Robinson Crusoé e estivéssemos estudando sua ilha anos depois de sua morte. O que poderíamos dizer sobre ele? Eis alguns exemplos:
·         saberíamos que aquele homem encontrava-se em uma ilha e deduziríamos, portanto, que deveria ter chegado ali em um navio. Deduziríamos também, observando que aproveitara todo o material do navio, que possuía conhecimentos sobre o uso de seus componentes e que, possivelmente, exercia alguma função a eles relacionada (marinheiro, carpinteiro, armeiro, capitão etc.);
·         o uso de armas como o mosquete o situa entre os séculos XVI e XVIII. Isso pode ser confirmado também pelo uso de tinta e penas para escrever. Desse modo, Robinson não poderia ter vivido antes ou depois dessa época;
·         possuía uma Bíblia – logo, era cristão. Se o arqueólogo que estivesse estudando os vestígios deixados por Robinson conhecesse a língua em que a Bíblia estivesse escrita, deduziria que ele, possivelmente, era inglês.
Além da profunda ligação com seu grupo social de origem, Robinson sentia a mais
profunda solidão. Esse sentimento perpassa toda a obra e encontra-se refletido nas atitudes que ele toma para amenizar o sofrimento causado pela ausência de outros seres humanos. Ele criou diversos animais, dentre eles um papagaio, ao qual ensinou a falar.
Destacamos a importância desse fato. Observe que o papagaio é um animal, dotado de instinto e não de razão, portanto, sua fala é apenas uma imitação daquilo que o ensinam a dizer, de modo que Poll apenas repetia a própria fala de Robinson. Era uma espécie de espelho para ele, de um “eco” de sua própria voz.
Por que Crusoé ensinou um papagaio a repetir o seu próprio nome, entre outras frases que imitavam um diálogo, mesmo sabendo que a ave jamais saberia o
que estava dizendo a ele?
O ser humano é um ser social, e não consegue sobreviver na ausência de outros seres humanos. No limite, o papagaio era apenas um substituto para sua necessidade mais premente: a de imaginar que outra pessoa estava interagindo com ele.
Espera-se termos desenvolvido a compreensão de que o ser humano não existe fora da sociedade, e que os recursos de que se utiliza para sobreviver, comunicar-se e relacionar-se com os outros compõem sua herança cultural e formam a base de sua identidade.
Discussão sobre trechos do filme Náufrago, de Robert Zemeckis
Aqui também o objetivo é utilizar a situação da personagem para introduzir o tema o ser humano como ser social. A situação da personagem do filme é muito semelhante à de Robinson Crusoé, com o diferencial de se passar em uma época muito mais próxima da nossa realidade do que aquela da obra de Daniel Defoe.
Sinopse: O filme Náufrago conta a história de Chuck Noland (interpretado por Tom Hanks), um engenheiro de sistemas de uma companhia de correios e entregas, que vive para o trabalho. Em uma de suas inúmeras viagens, o avião da companhia, sobrevoando o Oceano Pacífico, defronta-se com uma tempestade e uma súbita e inexplicável pane nas turbinas leva-o a uma queda no mar. Noland consegue acionar o equipamento de emergência e, a bordo de um pequeno bote salva-vidas, chega a uma minúscula ilha no meio do Oceano Pacífico, onde vive sozinho durante quatro anos, tendo como recursos apenas algumas caixas com encomendas da companhia que foram salvas do acidente. Sua única motivação para permanecer vivo é a lembrança da namorada Kelly (interpretada por Helen Hunt), cuja fotografia ele mantém em um relógio de bolso que ela havia lhe dado no último encontro antes do acidente. (Elaborado especialmente para o São Paulo faz escola).
O filme tem duração total de 144 minutos, e seria interessante assisti-lo.
Aqui selecionamos cenas, cuja ordem de exibição não compromete a sequência narrativa e atende perfeitamente ao objetivo de discutir a questão central desta reflexão: o ser humano é um ser social.
As cenas selecionadas são as de número 9, 10, 11, 12, 13 e 16, as quais, juntas, totalizam cerca de 35 minutos.
Reflexão sobre o filme
Até agora, tivemos a oportunidade de pensar sobre a situação vivenciada pela personagem do filme. As perguntas de interpretação do conteúdo assistido a que
eles responderam deverão servir de base para a reflexão.
As questões de número 6, 7 e 8, por exemplo, tiveram por objetivo chamar a atenção para o fato de que Chuck Noland, embora estivesse vivendo em condições precárias na ilha, não direcionava toda a sua energia apenas para a satisfação de suas necessidades vitais, mas manifestava certos comportamentos distintamente humanos, como o sepultamento de seu colega de trabalho, Albert Muller. Esses elementos são importantes componentes de sua identidade humana. Já a questão de número 11 teve por objetivo destacar a importância dos conhecimentos que ele detinha no episódio da tentativa de fazer fogo. Saber que para iniciar um processo de combustão é preciso combinar oxigênio, combustível e calor é um conhecimento adquirido a partir da convivência com outros grupos sociais, mostrando a importância da interação com os outros para a sobrevivência do ser humano.
Aqui buscaremos, a partir de uma discussão mais aprofundada do filme, realizar com os alunos uma reflexão a respeito da questão central: o ser humano é um ser social. Para isso, utilizaremos a situação enfrentada por Chuck Noland, procurando identificar os sentimentos e as atitudes da personagem nos diversos episódios da narrativa, para construir essa ideia de forma gradativa.
Que objeto você consideraria indispensável ter em mãos, caso se encontrassem em uma ilha deserta? Por quê?
Observe que a pergunta induz, necessariamente, à escolha de um objeto.
E se, por acaso, você se encontrasse em uma ilha deserta sem absolutamente nada?
O objetivo dessa pergunta é provocar a reflexão sobre a capacidade de sobrevivência do ser humano em condições adversas.
Você acham que Chuck Noland “deu sorte” por ter podido salvar alguns objetos das caixas da companhia de entregas por ele encontradas?
Ressalta-se que, em nenhum dos casos, ele tinha todas as condições adequadas para viver como um estadunidense do século XX, do modo como estava habituado.
Você acha que conseguiria sobreviver se tivessem exatamente os mesmos recursos de que Chuck Noland dispunha?
Atentamos para o fato de que Noland era engenheiro de sistemas e morava em Memphis, uma cidade grande no Estado da Virgínia, nos Estados Unidos. Sabia pouco, portanto, sobre como viver em um ambiente tropical.
E se você estivesse em uma ilha onde nevasse e fizesse muito frio? Como Noland sabia que era preciso esfregar dois pedaços de madeira para fazer fogo? Será que vocês também teriam tido a mesma ideia, se não tivessem assistido ao filme?
Talvez apresentemos soluções “mágicas”, como, por exemplo, “eu teria um canivete escondido no bolso”, ou “eu sempre levo um isqueiro comigo”. Desafio-o, a partir da à situação enfrentada pela personagem no filme, apresentar as soluções. Chamamos a atenção para o fato de que, inicialmente, Noland optou por não abrir as caixas da companhia de entregas. Naquele momento, ele dispunha apenas das próprias mãos e da própria engenhosidade para resolver seus problemas.
Um exemplo é o funeral que realizou para o seu colega de trabalho, Albert Muller. Os rituais realizados por Noland expressam, em grande parte, nossas crenças e os hábitos culturais que herdamos ao lidar com a morte. O modo como ele sepultou o corpo – enterramento –, o fato de ter coberto o rosto do cadáver, o gesto de ter colocado junto ao morto seus objetos pessoais – a carteira e, junto ao peito, a foto da família – são gestos simbólicos que aprendemos convivendo em sociedade. Também andava vestido, usava calçados, procurava alimentar-se de carne de caranguejo cozida e, mais importante ainda, buscava comunicar-se com outros seres humanos, primeiro por meio da linguagem oral (chamando por socorro) e, depois, escrita (escrevendo a palavra “socorro” na areia com os pés e depois, com pedaços de madeira).
Pensando dessa forma: Você acha que é possível identificar a origem de Chuck Noland aonde, quando e como ele vivia, observando o seu modo de vida?
Sim. Afinal, os seres humanos são tanto produtores de cultura como produtos de sua própria cultura. É observando os artefatos deixados pelos povos do passado que os arqueólogos, por exemplo, procuram entender de que maneiras diferentes grupos humanos viviam no passado.
Imagine que Noland não tivesse sobrevivido e chegássemos à ilha anos depois de sua morte. O que poderíamos dizer sobre ele? Eis alguns exemplos:
·         um homem viveu ali, pois deixou marcas da sua presença (objetos de fabricação humana, restos de fogueira, cocos verdes abertos);
·         esse homem estava de alguma forma ligado à empresa estadunidense de entregas, uma vez que parte dos objetos encontrados com etapas empreendidas para abri-los.
O que levou Noland a utilizar aqueles recursos para abrir o coco? Na tua opinião, ele poderia ter utilizado outro utensílio?
Destacamos o fato de a pedra ser mais dura que o coco.
Você parou para pensar sobre isso?
A mesma questão vale para as tentativas de fazer fogo. Como Noland sabia que esfregar pedaços de madeira, um contra o outro, seria eficiente para fazer fogo? Onde será que ele aprendeu isso?
Enfatizamos que ele combinou seus conhecimentos com sua criatividade, buscando alternativas, a partir de sucessivas tentativas e erros, para encontrar soluções para um problema.
O comportamento do ser humano, como ser racional, caracteriza-se pela combinação destes dois fatores: a união dos conhecimentos herdados dos seus grupos sociais de origem e sua própria capacidade de raciocinar, questionar, criar e resolver problemas. Foi essa herança cultural que tornou possível a transformação dos recursos retirados da natureza em meios para a sobrevivência. Pensando dessa forma, reflitamos:
Você acha que Chuck Noland encontrava-se realmente isolado na ilha desabitada em que vivia?
Fisicamente sim, mas na realidade ele estava culturalmente ligado à sociedade estadunidense de onde viera e, também, às diversas sociedades ao redor do mundo com quem mantivera contato em suas inúmeras viagens como funcionário da companhia de entregas.
Você acha que Chuck Noland teria sobrevivido sem os conhecimentos que ele havia trazido dos Estados Unidos?
O instinto de sobrevivência do ser humano é extremamente forte. Noland talvez tivesse sobrevivido, mas certamente não viveria da forma como viveu na ilha. Seu modo de vida refletia seu passado em sociedade.
·         a presença desse homem na ilha só pode ter se dado a partir de 1994, quando a empresa de entregas passou a adotar, oficialmente, aquele logotipo;
·         na década de 1990, as fitas de videocassete VHS ainda eram bastante difundidas, de modo que podemos situar o período em que esse homem viveu na ilha mais ou menos nessa época;
·         as marcas que ele deixou na pedra indicam que ele tinha conhecimentos matemáticos e sabia fazer cálculos, logo, era alfabetizado, e, como utilizava o sistema de milhas, e não de quilômetros, provavelmente era estadunidense ou inglês.
Além da profunda ligação com seu grupo social de origem, Noland sentia a mais profunda solidão. Esse sentimento perpassa todo o filme e encontra-se refletido nas atitudes que ele toma para amenizar o sofrimento causado pela ausência de outros seres humanos. A principal delas é a criação de um amigo imaginário, Wilson. Destacamos a importância desse fato. Observe que Wilson é, na realidade, uma bola de vôlei, com uma marca de sangue que representa um rosto, incapaz de falar. Portanto, sua “fala” é apenas imaginada por Noland. Nesse sentido, Wilson servia apenas de contraponto para um diálogo imaginário. Era uma espécie de espelho para Noland, de um “eco” de sua própria voz. A partir da marca deixada por ele – uma marca distintamente humana, de sua mão, com seu próprio sangue –, Noland desenha um rosto e começa a conversar com ele, o que pode ser interpretado como uma projeção de toda a angústia causada pela falta da presença de outros seres humanos. Aos poucos, esse rosto assume uma identidade e torna-se outra pessoa, fora dele, com quem Noland dialoga e passa a viver em sociedade.
Em que momento, exatamente, essa sociedade se formou?
A partir do instante em que Noland se dirige a Wilson, procurando estimar qual sua posição geográfica com base em sua recapitulação dos fatos e eventos que antecederam o acidente, e passa a utilizar a primeira pessoa do plural, o pronome pessoal “nós”.
Por que Noland passa a falar com Wilson, mesmo sabendo que ele era apenas uma bola de vôlei suja de sangue?
O ser humano é um ser social, e não consegue sobreviver na ausência de outros seres humanos. No limite, a bola de vôlei com a carinha pintada, batizada de Wilson, era apenas um substituto para sua necessidade mais premente: a de imaginar que outra pessoa estava interagindo com ele.
Esperamos que  tenha desenvolvido a compreensão de que o ser humano não existe fora da sociedade, e que os recursos de que utiliza para sobreviver, se comunicar e se relacionar com os outros compõem sua herança cultural e formam a base de sua identidade enquanto ser humano.



[1] Pequeno recipiente de madeira, destinado a armazenar mercadorias.
[2] Antiga arma de fogo, parecida com uma espingarda.
[3] Grande recipiente de madeira formado por dois tampos planos e tábuas encurvadas unidas por aros metálicos.
[4] Cerca feita com estacas apontadas e fincadas na terra.
[5] Ferramenta manual para aplainar, desbastar, facear e alisar madeiras.

Questões:
1. Quais são as primeiras coisas que Robinson Crusoé faz ao despertar em terra, após o naufrágio?
2. Ao descobrir que o navio, trazido pela tempestade, encontrava-se próximo à praia e continuava inteiro, Robinson decide ir até ele e ver o que podia salvar da carga. Que tipo de utensílios e ferramentas ele recupera do navio e por que os considera valiosas “riquezas” para um náufrago?
3. Descreva as condições em que Robinson se viu, nos primeiros meses de seu exílio na ilha, e o seu estado de espírito.
4. Alguns comportamentos adotados por Robinson Crusoé não são relacionados diretamente à satisfação de necessidades básicas como alimentação, abrigo e descanso. Dentre as atividades citadas na obra, descreva duas que não se referem propriamente à sobrevivência.
5. Em diversos momentos do texto, Robinson utiliza-se de conhecimentos adquiridos no Brasil para atingir um objetivo. Você pode citar alguns exemplos?
6. Originalmente, Robinson era marinheiro e explorador. Não conhecia muito dos ofícios que viria a desenvolver na ilha. Com base na leitura do texto, cite o que ele aprendeu a fazer, nos anos em que viveu isolado, tendo apenas as poucas ferramentas que recuperara do navio e os conhecimentos que detinha na época (século XVII).
7. Durante os anos em que viveu sozinho na ilha, Robinson criou diversos animais de estimação, dentre eles um papagaio chamado Poll, ao qual ensinou a falar. Você poderia explicar por que ele fez isso?
8. Quais são as primeiras coisas que Chuck Noland faz ao despertar na praia, após o acidente?
9. De que formas Noland procura se comunicar para pedir socorro?
10. Ao descobrir os cocos verdes, Noland procura abri-los a fim de beber a água e alimentar-se da polpa. Enumere a ordem 2 das etapas empreendidas no esforço para abri-los.
(4) Utilizar uma pedra para parti-los.
(1) Atirá-los contra uma parede de pedra.
(6) Utilizar duas pedras combinadas, uma como martelo, outra como cinzel, para furar o coco.
(2) Esmurrar o coco contra a parede de pedra.
(5) Utilizar uma pedra lascada como ferramenta para cortar a casca.
(3) Tentar abri-los esmurrando-os contra uma rocha pontiaguda.
11. A certa altura, Noland saiu em exploração pela beira da água. Quais eram seus objetivos?
a) Descobrir onde estava.
b) Reconhecer o território.
c) Perceber os limites geográficos do local.
d) Encontrar outros seres humanos.
e) Todas as alternativas anteriores.
12. Quais foram suas descobertas?
13. Durante a expedição, Noland avista o que parece ser um dos seus companheiros do acidente. Desesperado, corre até ele, mas, ao chegar, encontra apenas um cadáver. Com base no que você viu no filme, responda: O que levou Noland a correr desesperadamente em direção àquilo que vira do ponto mais alto da ilha?
14. Ao constatar que seu colega de trabalho estava morto, por que Noland se deu ao trabalho de trazer o corpo até a ilha e enterrá-lo?
15. Quais são os rituais que Noland realizou durante o funeral?
16. Quais foram os objetos que Noland encontrou ao abrir as caixas recolhidas do acidente?
a) Relógio de bolso, pager, vestido, fitas de videocassete, papéis de divórcio, bola de vôlei, patins de gelo.
b) Cartão de aniversário, lanterna, fitas de videocassete, vestido, bola de vôlei, patins de gelo, plástico bolha.
c) Papéis de divócio, fitas de videocassete, bola de vôlei, patins de gelo, cartão de aniversário, pager, sapatos pretos.
d) Fitas de videocassete, papéis de divórcio, cartão de aniversário, bola de vôlei, patins de gelo, vestido.
17. Descreva, com suas próprias palavras, de que modo a personagem utiliza esses objetos para transformar os recursos naturais e mesmo aquilo de que dispunha em meios para a sua sobrevivência.
18. Como Noland conseguiu fazer fogo? Descreva as etapas percorridas para que ele conseguisse e os fatores que o levaram a ter sucesso.
19. Quem é Wilson?

Como explicar e entender a “liberdade de escolha” no mundo em que vivemos?

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