O Parlamento russo, a Duma, aprovou esta
sexta-feira a descriminalização da violência doméstica com 380 votos contra
três. A nova moldura legal não prevê penalizações nos casos em que “não existam
lesões corporais graves” e quando não ocorram mais do que uma vez por ano. A
violência doméstica passa de uma ofensa criminal a uma ofensa administrativa.
Segundo a agência de notícias russa Tass, a legislação agora aprovada, a
chamada “lei da bofetada”, altera o artigo 116.º do código penal russo ao
excluir das ofensas criminais as agressões físicas a familiares, sejam pais que
batam nos filhos ou maridos que agridam esposas. Só no caso de haver agressões
recorrentes é que alguém poderá vir a ser processado criminalmente.
A nova legislação descriminaliza agressões com dor física, desde que não
causem “lesões corporais graves”. Só no caso de haver algum risco para a saúde
da vítima é que o agressor enfrenta acusações criminais.
Nos casos de agressões repetidas os acusados enfrentam uma multa até 40
mil rublos (621 euros), serviço comunitário obrigatório até seis meses ou uma
pena de prisão até três meses. O delito administrativo para agressões físicas
pela primeira vez prevê uma multa de até 30 mil rublos (466), prisão até 15
dias ou serviço comunitário obrigatório até 120 horas.
A primeira proposta para despenalizar a violência familiar provocou
polémica. Vyacheslav Volodin, porta-voz da Duma, classificou esta lei como
sendo de "de alto nível" e prometeu levar em conta a opinião pública
durante a segunda discussão.
Segundo a agência Tass, no início desta semana, Volodin disse aos
jornalistas que as sondagens mostraram que 59% dos entrevistados se
pronunciaram contra a punição severa por pequenos conflitos na família, quando
daí não resultassem danos físicos ou lesões graves.
Por seu lado, a deputada Olga Batálina, uma das autoras da lei, citou o
Centro de Pesquisa de Opinião Pública da Rússia para dizer que a maioria dos
russos condena a violência doméstica, mas apoia a iniciativa de aliviar as
penas para agressões pela primeira vez.
Outra deputada, Yelena Mizúlina, ultraconservadora do Partido Rússia
Justa, também co-autora da lei, afirmou na semana passada que a nova legislação
aplica-se a agressões que provoquem apenas “contusões e escoriações”, que, no
seu entender, são agressões livres de responsabilidade. “Na tradição cultural
da família russa, as relações entre pais e filhos estão construídas sobre a
autoridade dos pais”, apontou Mizúlina, citada pelo El
País. E acrescentou que “as leis devem apoiar esta tradição familiar”.
Esta foi a mesma deputada que no Verão de 2013 impulsionou a lei contra a
propaganda homossexual, discriminatória a minorias sexuais.
A nova lei passará agora por uma votação no Conselho da Federação do
Senado, onde nenhuma oposição é esperada. Deverá ser depois aprovada pelo
presidente Vladimir Putin, que já se mostrou favorável à sua aplicação.
Esta lei faz com que a Rússia se torne no país da Europa com a
legislação sobre a violência doméstica mais permissiva. E isto acontece à
revelia das sugestões da ONU e do Centro Anti-Discriminação “Memorial”, que
classificam os esforços para acabar com as práticas tradicionais de violência
doméstica como “insuficientes”.
Na Rússia a violência no seio familiar é um problema grave. As vítimas
são quase sempre mulheres: 74% das vítimas pertencem ao género feminino, e em
91% dos casos, as agressões são perpetradas por cônjuges ou companheiros,
concluem estudos do Governo russo. Dados do Governo russo, também citados pelo
El País, apontavam para 36 mil mulheres agredidas todos os dias. As mortes, uma
das consequências do espancamento, são frequentes: dados de 2008 indicam que 14
mil mulheres morreram por agressão só nesse ano. Este número foi confirmado
pelo Ministério do Interior russo.
Fonte: Público UOL
Fonte: Público UOL