quinta-feira, 10 de março de 2016

Cidadania “ativa” e cidadania “passiva”

É importante ressaltar o lugar do cidadão brasileiro no processo histórico de constituição dos seus direitos civis, sociais e políticos. Para isso, destacaremos particularmente a transição da Velha República para o Estado Novo, quando, na primeira metade do século XX, observou-se um período de intensa agitação política envolvendo vários grupos sociais (Greve Geral de 1917, Revolta Tenentista e fundação do Partido Comunista do Brasil em 1922, Revolução de 1924, Coluna Prestes etc.) e, depois, o estabelecimento do Estado Novo e o fortalecimento do governo central em torno da figura de Getúlio Vargas.
A força motriz que impulsionou a queda da Primeira República e culminou na Revolta Civil e Militar de 1930 pode ser explicada pelo anseio de grupos divergentes (segmentos mais novos da hierarquia militar, chefes políticos de fora do eixo Minas Gerais-São Paulo, pensadores liberais, intelectuais de classe média e a nova classe trabalhadora emergente nos centros urbanos) de pôr fim à concentração do poder nas mãos das oligarquias dos grandes proprietários rurais.
De 1930 a 1937, a participação de vários setores da população em movimentos políticos de massa de âmbito nacional foi fundamental para assegurar a conquista de direitos políticos e sociais inovadores. Porém, o golpe de 1937 inverteu a relação entre Estado e sociedade, ao impor um regime ditatorial civil, garantido pelas Forças Armadas.
Destacamos aqui não é tanto o encadeamento dos eventos históricos, mas a relação entre Estado e cidadãos, principalmente, quais eram os atores políticos que ocupavam ambas as esferas e questionando por que determinadas categorias sociais ainda se encontravam excluídas da arena política enquanto sujeitos de sua própria cidadania. Essa ambiguidade pode ser explicada pelo processo de cidadania “ativa” e “passiva”.

O esquema a seguir ajudará na compreensão do tema:

É importante refletir sobre algumas questões: “Qual é a relação existente entre Estado e sociedade quando os cidadãos governam por meio de representantes democraticamente eleitos? E qual é essa relação quando o Estado governa por tradição, conquista externa, golpe, força militar ou ditadura”?
Se analisarmos em qual situação os cidadãos têm mais condições de atuar na modificação das leis, na luta por direitos e na consolidação do seu estatuto perante a sociedade, concluiremos, prematuramente, que, no primeiro caso, os cidadãos terão maior liberdade de modificar a atuação do Estado a seu favor. Porém, destacamos que a disputa pela participação no poder nunca é imparcial e que os interesses políticos estão sempre em jogo, ou seja, dependendo de quem está ocupando os espaços de poder e de quem tem mais capacidade de mobilização, angariar apoio e influenciar outros grupos sociais, os resultados dessa relação podem favorecer alguns grupos em detrimento de outros.
Isso pode ser comprovado pela comparação dos principais eventos históricos do período na política nacional. Existe uma dinâmica da relação entre Estado e sociedade e as consequências para as categorias sociais excluídas dessa relação no processo de consolidação da cidadania no Brasil.
Observe que a maior parte desses movimentos teve início nas capitais dos Estados, e só então eles se espalharam para o interior do país, como foi o caso da Coluna Prestes, em 1925. Nesse sentido, a maior parte da população, que na época ainda residia e trabalhava predominantemente no meio rural, permaneceu à margem dos acontecimentos do período, podendo, quando muito, apoiar, opor-se ou manter-se indiferente a eles.
Além disso, é importante lembrar que boa parte desse contingente estava excluída das listas eleitorais, por ser analfabeta. Esse fato é claramente observável ao analisarmos o desenvolvimento dos direitos sociais entre 1930 e 1945.
Embora a legislação sindical, trabalhista e previdenciária que emergiu durante o Estado Novo tenha favorecido os trabalhadores, “os direitos foram assegurados em função da categoria profissional a que pertencia o indivíduo, ou seja, somente aqueles que integravam o universo das profissões reconhecidas ingressavam no sistema. Estavam excluídos, portanto, trabalhadores rurais, domésticos, autônomos, desempregados, subempregados, além de todos aqueles que exerciam profissões não regulamentadas”. O período entre o pré-Estado Novo e as ações do governo durante o regime constitucionalista (1930 a 1934) e durante o Estado Novo caracteriza bem essa questão.
O principal ponto a ser posto em discussão é a participação política dos diferentes atores sociais na relação entre Estado e sociedade e sua contribuição para o desenvolvimento de uma cidadania ativa. Questiona-se a validade dos trabalhadores terem adquirido direitos de cidadania por meio de leis sociais decretadas por um Estado autoritário, e não por meio de sua ação sindical e política independente. O que está em questão é o tipo de cidadania que resulta dessa relação com o Estado. Por isso, dizemos: “A cidadania que daí resultava era passiva e receptora antes que ativa e reivindicadora”.

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