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Ênfase em teste empobrece a qualidade da educação, diz Nobel


Ênfase em teste empobrece a qualidade da educação, diz Nobel

Para economista americano, escolas estão deixando de trabalhar habilidades como motivação, controle emocional e interação social.

Pressionadas pela cobrança de resultados em testes que mede o desempenho de alunos em leitura e matemática, as escolas estão cada vez mais negligenciando outras disciplinas e aspectos da formação igualmente importante para explicar o sucesso na vida adulta.

Essa crítica não é feita por alguém avesso a avaliações. Pelo contrário. O autor é o professor da Universidade de Chicago James Heckman, 67.

Ele ganhou o Prêmio Nobel de Economia em 2000 justamente por sua contribuição na criação de métodos estatísticos que ajudaram a medir com mais precisão o impacto de políticas públicas.

Seus estudos mostram que intervenções de qualidade que beneficiam crianças de famílias pobres desde a primeira infância têm impactos duradouros na vida adulta.

Os impactos mais significativos, porém, não são medidos em testes de matemática ou linguagem. São, principalmente, o que chama de habilidades não cognitivas, como motivação, controle emocional, disciplina ou capacidade de interação social.

Essas são características que também devem ser trabalhadas pela escola e que têm impacto significativo em fatores com renda futura, envolvimento em crimes, gravidez precoce e outros apontados em seus estudos.

Alguns deles foram feitos com o economista brasileiro Rodrigo Pinto, doutorando da Universidade de Chicago que participou da entrevista.

Heckman estará em São Paulo na semana que vem para o seminário Educação para o Século 21, promovido pelo Instituto Ayrton Senna.

Folha – O papel da escola está sendo reduzido a preparar para testes?
James Heckman –
Com certeza. É curioso porque, se pesquisarmos o que diziam os criadores desses testes, hoje aplicados a milhões de estudantes, eles sempre afirmaram que os exames captavam apenas parte do que se esperava da escola. Antes dos testes, a visão tradicional da educação era que as pessoas iam para escola para aprender a ter caráter, persistência, sociabilidade, coisas assim. Daí surgiram medidas para avaliar outras habilidades. Foi o caso do teste de QI, criado no início do século passado para prever quem ia ser bem sucedido na escola. Um dos primeiros pesquisadores a desenvolver avaliações como essa, o psicólogo francês Alfred Binet, já admitia desde aquela época que outras habilidades importantes para o sucesso na escola não eram medidas por esses testes. O mesmo diziam os criadores do teste de Iowa, que foi uma enorme inovação nos EUA, há 60 anos, ao permitir que respostas fossem marcadas em cartões lidos por máquinas que facilitaram a aplicação de provas em massa. É irônico que o fogo da escola tenha sido revertido para ensinar apenas aos alunos a ir bem nesses testes. É uma subversão. As escolas nos EUA têm abandonado aulas de música, física ou outros assuntos por entenderem que isso é irrelevante e que o que importa é ir bem a testes de leitura e matemática. Se eu digo que algum aspecto da sua vida será recompensado e outros não, as pessoas vão naturalmente desenvolver mais a parte que é recompensada. É o que está acontecendo nos EUA. Professores e diretores estão agindo assim não porque estão interessados em desenvolver a criança, mas em prepará-las para testes para que eles sejam vistos como bons professores e diretores.


Crianças pobres já entram na escola defasadas
O economista James Heckman é um defensor proeminente de políticas de qualidade para a primeira infância como forma de diminuir a desigualdade.

Seus estudos mostram que crianças mais pobres já entram na escola com defasagem de vocabulário e que, nos EUA, 93% da diferença cognitiva medida aos 13 anos entre filhos de mães com alta escolaridade e filhos de mulheres de baixa instrução já está presente aos cinco anos.

Estudos de neurociência também mostram que crianças que interagem mais com os pais e se sentem seguras e estimuladas desenvolvem melhor áreas do cérebro que controlam as emoções.

Isso ajuda a explicar por que crianças que passaram por extrema negligência têm mais probabilidade de se envolver em crimes quando adultas.

Por Antônio Gois.

Fonte: Folha de São Paulo, Ano 91 - Edição 30.147 – Ano 91 – 17.10.2011 p. A12

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